Blog do Fernando Rodrigues

Marta e o PT querem o mandato no Senado: quem tem razão?

Fernando Rodrigues

Disputa entre ex-petista e partido vai criar regra histórica

Decisão sobre a quem pertence o mandato será do TSE

Se Marta vencer, abre-se a porteira para debandada petista

Marta-e-Sarney

Foto da festa dos 70 anos de Marta, em 20.mar.2015

Será da Justiça Eleitoral a palavra final sobre a quem pertence o mandato de senadora de Marta Suplicy –se ao PT ou à política que deixou a legenda nesta terça-feira, 28.abr.2015. A decisão terá caráter histórico. Definirá, em grande parte, o rumo da política partidária nacional.

O Tribunal Superior Eleitoral nunca teve de julgar um caso semelhante envolvendo um político eleito para um cargo majoritário, como é o caso da vaga no Senado ainda sob controle de Marta Suplicy.

A disputa tem um desfecho ainda imprevisível. Os dois lados tem argumentos sólidos.

Por que Marta saiu do PT? Ela basicamente alega que os princípios e o programa partidário do PT “nunca foram tão renegados pela própria agremiação, de forma reiterada e persistente”. E mais: “O Partido dos Trabalhadores tem sido protagonista de um dos maiores escândalos de corrupção que a nação brasileira já experimentou”.

Marta diz que “não tem como conviver com esta situação sem que essa atitude implique uma inaceitável conivência”. Em outras palavras, quem fica no PT é conivente com a corrupção.

Marta está correta? A Justiça Eleitoral dirá.

Mas é lícito imaginar que a agora ex-petista, inteligente, já desconfiasse disso há muito tempo. Por que não saiu antes? Durante a crise do mensalão, em 2005 e 2006, por exemplo, estava claro que o PT não era, nem de longe, a mesma agremiação que a senadora havia ajudado a criar há cerca de 30 anos.

Depois, em 2012, quando Marta Suplicy buscou avidamente ser candidata a prefeita de São Paulo –e foi impedida por Luiz Inácio Lula da Silva– havia também muitos indícios adicionais de que o PT estava cada vez mais distante de seus pressupostos iniciais.

Mas Marta insistiu. Em 2014, ela desejou ser candidata a governadora de São Paulo pelo PT. Novamente, Luiz Inácio Lula da Silva não quis. A senadora ficou irritada. Preparou então sua saída definitiva do PT.

Se Marta tivesse sido candidata ao governo de São Paulo em 2014 e vencido a eleição, pelo PT, teria o mesmo ânimo para agora sair da legenda? Nunca saberemos.

Apesar dessas ponderações, é importante ressaltar que o fulcro central do argumento martista para sair do PT é correto: o partido está muito longe dos princípios que um dia defendeu.

O que não está claro é a razão pela qual Marta vocalizou tudo agora e só neste momento resolveu sair do PT –justamente depois de ter sido preterida duas vezes em eleições nas quais desejava ter sido candidata (para a Prefeitura de São Paulo e para o governo paulista).

Parafraseando Ortega y Gasset, “a senadora é ela e a sua circunstância”.

O tema chegará à Justiça Eleitoral porque o PT vai requerer o mandato da senadora –há alguns anos ficou decidido pelo TSE que os mandatos pertencem aos partidos, e não aos políticos eleitos.

Caberá ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) negar ou aceitar o argumento usado por Marta Suplicy.

A rigor, saída de um político de um partido está resguardada, sem perda do mandato, no caso de a agremiação ter se desviado dos compromissos assumidos durante o processo eleitoral.

Apesar de ser mais ou menos senso comum a alteração no comportamento do PT nos últimos anos (há pesquisas em profusão a respeito), é claro que a legenda nega. Além do mais, sempre será um caso de interpretação para os magistrados que cuidarem do caso.

Há também um aspecto que talvez devesse merecer reflexão por parte de Marta Suplicy. O partido que no momento ela renega tem 1.584.178 filiados no país, segundo dados oficiais do TSE. É muita gente. Não há notícia de desfiliação em massa até o momento.

Ao sair do PT, Marta disse que não poderia compactuar com corrupção. Por analogia, pode-se concluir que os 1.584.178 filiados que permanecem no PT estão, eles próprios, por causa de sua inação, compactuando com a corrupção.

Ou, pelo menos, o que Marta Suplicy está deixando implícito é que 1,5 milhão de petistas não se incomodam com o fato de o PT estar renegando os princípios e o seu programa partidário “de forma reiterada e persistente”.

O episódio é complexo.

A resposta definitiva será dada pela Justiça Eleitoral.

Se TSE decidir que Marta tem razão e pode manter o seu mandato de senadora, abrirá a porteira para dezenas de congressistas petistas tomarem o mesmo caminho. A Justiça Eleitoral também estará concordando com o argumento martista que mais irritou o PT: quem fica no partido compactua com a corrupção.

Por outro lado, se o PT for vitorioso e conseguir herdar o mandato de Marta –assumiria o suplente petista Paulo Frateschi–, o recado do TSE será também muito claro. Os políticos ficarão para sempre escravos dos regimes autocratas vigente hoje nas cúpulas partidárias.

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