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Brasil não arquiva telefonemas presidenciais a outros chefes de Estado
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Fernando Rodrigues

Conversas de valor histórico se perdem por falta de organização

Acervo dos EUA publica diálogos de Bush com Sarney e Collor

Um historiador que busca conversas telefônicas de ex-presidentes brasileiros com chefes de Estado de outros países ficará frustrado ao pesquisar no Palácio do Planalto. O Brasil não guarda áudios nem transcrições das ligações feitas e recebidas por seus presidentes.

A prática destoa da aplicada nos Estados Unidos –uma pesquisa no acervo de George Bush pai, presidente norte-americano de 1989 a 1993, fornece transcrições de suas conversas com os ex-presidentes brasileiros José Sarney e Fernando Collor de Mello.

A jovem democracia brasileira, restaurada a partir de 1985, ainda não tem uma política de Estado para o tema. Isso leva os presidentes a definirem regras informais. Cada um lida como bem entende com os registros de telefonemas para homólogos de outros países.

O assessor de assuntos internacionais da Presidência da República, Marco Aurélio Garcia, chegou a afirmar em 18.out.2013 ao programa “Poder e Política”, do UOL e da “Folha”, que gostaria que o áudio das conversas fosse gravado e arquivado, mas não o era por falta de costume.

Segundo ele, os diálogos de presidentes brasileiros eram anotados em minutas, tornadas públicas após 15 anos –prazo da Lei de Acesso a Informações Públicas para a divulgação de documentos classificados como secretos.

Assista abaixo à declaração de Garcia sobre o tema:

 

A partir dessa informação, o Blog pediu ao Planalto os registros das conversas de José Sarney, Fernando Collor e Fernando Henrique Cardoso (até 15 anos atrás, em novembro de 1998). O governo respondeu que não havia nada do gênero no acervo da Presidência.

Indagado a respeito, Garcia disse, por meio de sua assessoria, que havia se equivocado durante a entrevista ao UOL e à “Folha”. Retificou-se afirmando que os registros de telefonemas eram notas “informais” e “eventuais”, não arquivadas para a posteridade. O único registro dessas conversas seriam as notas à imprensa divulgadas pela Secretaria de Comunicação.

O ex-chanceler e atual ministro da Defesa Celso Amorim também gostaria que os telefonemas presidenciais fossem ao menos anotados e arquivados para a posteridade. “Que é importante para a história, não tenho dúvida que é”, disse em 26.nov.2013 ao “Poder e Política” .

Amorim relata que, quando era ministro das Relações Exteriores e acompanhava telefonemas entre o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e outros chefes de Estado, estava mais preocupado com o resultado imediato da conversa do que com a guarda do seu conteúdo. Assista abaixo à sua declaração:

 

O Blog também perguntou aos ex-presidentes Fernando Henrique Cardoso, Fernando Collor e José Sarney se tinham registros de ligações telefônicas para outros chefes de Estado.

O Instituto FHC respondeu que, se houve gravação desses telefonemas, a cópia estaria nos arquivos do Itamaraty. “Há certamente telefonemas puramente cerimoniais cujo teor não tem muito, senão nenhum interesse político”, informou a entidade. O Itamaraty, porém, diz não ter nenhuma conversa gravada entre FHC e outros chefes de Estado.

A assessoria do ex-presidente Fernando Collor de Mello informou que não poderia responder se esses diálogos eram gravados ou não durante o seu mandato no Executivo. O Blog também entrou em contato com a assessoria de José Sarney, mas não obteve resposta

Diálogos de Bush com Sarney e Collor

Os arquivos dos presidentes norte-americanos permanecem em sigilo por 12 anos após o final da administração. Documentos confidenciais são regidos por uma lei própria e podem demorar mais para vir a público.

Esse é um aspecto que foi negligenciado na Lei de Acesso a Informações Públicas. No Brasil, só há 3 tipos de classificação de sigilo: reservada (5 anos de sigilo), secreta (15 anos) e ultrassecreta (25 anos).

Em alguma situações, é razoável que um presidente, governador ou prefeito prefira que parte de suas conversas com autoridades nacionais ou estrangeiras fiquem reservadas até o final de seu mandato –ou até algum tempo depois. Mas a Lei de Acesso à Informação não contém um dispositivo para esses casos específicos.

Classificar uma conversa presidencial como reservada (5 anos) pode ser pouco, a depender do caso. Os mandatos de cargos executivos são de 4 anos no Brasil. O ocupante do Palácio do Planalto tem o direito de tentar se reeleger. Um registro de um telefonema no primeiro ano de seu governo poderia, estando classificado como “reservado”, ser divulgado no início do seu segundo mandato.

O acervo do ex-presidente dos EUA George Bush permite consultar a transcrição de mais de 1.200 diálogos telefônicos entre ele e outros chefes de Estado e autoridades internacionais durante seu mandato, de 1989 a 1993.

Nessa lista está uma ligação de Bush para o então presidente José Sarney, em 17 de maio de 1989. O assunto era o Panamá, que vivia sob o jugo do ditador Manuel Noriega.

Reprodução

Minuta da conversa entre Bush e Sarney/Reprodução

No diálogo, Bush busca apoio de Sarney para aprovar uma “forte resolução” na OEA (Organização dos Estados Americanos) que pedisse a saída de Noriega e a sua substituição por um governo democraticamente eleito.

O presidente brasileiro concorda com uma resolução nessa linha, mas ressalta ser contra uma intervenção direta no país. Sarney também defende o respeito ao tratado que regia o canal do Panamá.

Em resposta, Bush se diz preocupado com o “mau exemplo” que o Panamá poderia enviar às jovens democracias da região. E afirma que, se houvesse uma resolução forte da OEA, Noriega seria forçado a sair.

Ao final do diálogo, o presidente dos Estados Unidos diz admirar o “esforço criativo” de Sarney para conduzir a transição da ditadura para a democracia no Brasil.

A ressalva de Sarney contra a intervenção direta no Panamá não surtiu efeito: 7 meses depois da conversa entre os 2 presidentes, os Estados Unidos invadiram o país e capturaram Noriega, um ex-agente da CIA.

O acervo de Bush também registra uma conversa entre ele e o então presidente brasileiro Fernando Collor de Mello, em 28 de junho de 1990.

Transcrição do telefonema entre Bush e Collor/Reprodução

Transcrição do telefonema entre Bush e Collor/Reprodução

Collor tomou a iniciativa do telefonema. Queria elogiar o presidente norte-americano pelo lançamento, no dia anterior, do Programa Iniciativa para as Américas, apelidado de “Plano Bush”. O principal ponto era a construção da Alca (Área de Livre Comércio nas Américas).

Na conversa, Collor afirma que o plano de Bush daria instrumentos à América Latina para que tivesse “mais esperanças no futuro”. “Seu programa é inovador e vai na mesma direção das políticas de livre mercado em implantação no Brasil”, disse Collor, que no seu mandato teve uma política de abertura do país para a entrada de produtos estrangeiros.

Bush agradeceu as palavras de apoio. Em retribuição, solidarizou-se com a derrota da seleção brasileira de futebol para a Argentina, que havia ocorrido 4 dias antes, durante as oitavas de final Copa da Itália.

“Nosso time também levou uma surra, porém sei que o Brasil está numa categoria diferente e que vocês levam esse jogo a sério. Mas, como falamos: sempre haverá o próximo ano”, disse o norte-americano.

(Bruno Lupion)

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Acordo nuclear com o Irã atrasou três anos, diz Celso Amorim
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Fernando Rodrigues

O ministro da Defesa, Celso Amorim, afirma que o acordo sobre energia nuclear alinhavado em 2010 pelo Brasil e pela Turquia com o Irã era mais duro do que o atual, que acaba de ser anunciado.

Em certa medida, a negociação mediada em 2010 atenderia também mais aos interesses dos Estados Unidos do que o acerto do último domingo, assinado em Genebra entre Irã e o chamado P5+1 (EUA, Reino Unido, França, Alemanha, Rússia e China).

Em entrevista ao programa Poder e Política, do UOL e da “Folha”, Amorim afirmou que “foram três anos perdidos” desde a iniciativa liderada por Brasil e Turquia. “Do ponto de vista dos países ocidentais e dos Estados Unidos, aquele acordo [de 2010] era muito simples, muito matemático. Era tudo muito verificável”, diz o ministro da Defesa, que foi durante oito anos (2003-2012) o titular da pasta de Relações Exteriores no governo de Luiz Inácio Lula da Silva.

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