Blog do Fernando Rodrigues

Arquivo : Mossack & Fonseca

Coaf detecta “movimentação atípica” de apenas 31 citados nos Panama Papers
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Fernando Rodrigues

Transações financeiras foram alvo de relatórios do Coaf

Coaf não conseguiu identificar 26 contribuintes citados

Órgão ligado ao Ministério da Fazenda não repassa nomes

Número de casos indica possível incapacidade de apuração

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Barras de ouro com o logo do banco suíço UBS

O Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) identificou movimentações financeiras atípicas de pelo menos 31 pessoas e empresas mencionadas na série de reportagens dos Panama Papers.

As informações são do repórter do UOL André Shalders.

Transações bancárias desses 31 contribuintes caíram numa espécie de  “malha fina” do Coaf. Consideradas suspeitas, foram descritas em Relatórios de Inteligência Financeira (os chamados RIFs) e encaminhadas à Receita Federal, ao Ministério Público Federal, ao Banco Central e à Polícia Federal.

O Coaf informou ao Blog que não conseguiu relacionar os nomes de 26 pessoas e empresas citadas com nenhum CPF ou CNPJ.

Os números mencionados pelo Coaf são modestos. Podem indicar uma incapacidade do órgão de fazer as checagens devidas. Por exemplo, o UOL revelou em 3 de abril de 2016 que os Panama Papers revelaram a existência de, pelo menos, 107 empresas offshore ligadas a personagens da Lava Jato –firmas que até aquele momento não tinham sido mencionadas pelos investigadores brasileiros que cuidam das investigações relacionadas ao escândalo da Petrobras.

Em 4 de abril de 2016, o UOL revelou que os Panama Papers mostravam empresas offshore relacionadas a políticos brasileiros e seus familiares com ligação às seguintes siglas: PDT, PMDB, PP, PSB, PSD, PSDB e PTB.

A série Panama Papers, que começou a ser publicada em 3.abr.2016, é uma iniciativa do ICIJ (Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos), organização sem fins lucrativos e com sede em Washington, nos EUA. Os dados foram obtidos pelo jornal Süddeutsche Zeitung. O material está em investigação há cerca de 1 ano. Participam desse trabalho com exclusividade no Brasil o UOL, o jornal “O Estado de S.Paulo” e a RedeTV!.

No Brasil, os bancos são obrigados a informar ao Coaf sobre qualquer transação bancária de alto valor. Movimentações de quantias superiores a R$ 100 mil em dinheiro vivo também precisam ser relatadas, bem como operações que estejam discrepantes do histórico dos clientes. A maioria não indica a existência de irregularidade. Mas algumas caem na “malha fina” e são checadas por técnicos do Coaf.

NO SWISSLEAKS, FORAM 50 CASOS
O Coaf também realizou esse tipo de apuração após a publicação da série de reportagens SwissLeaks, baseada em informações do banco HSBC da Suíça. Na época, foram encontrados “indícios de ilícitos” relacionados a 50 dos 126 brasileiros cujos nomes foram divulgados na série. Conheça os detalhes aqui.

A MANIFESTAÇÃO DO COAF
Leia abaixo a íntegra da manifestação do Coaf sobre o assunto, encaminhada ao Blog por meio do Ministério da Fazenda:

“As informações que foram veiculadas pela imprensa a partir de abril deste ano divulgaram 80 nomes de pessoas físicas e/ou jurídicas, dos quais 54 identificou-se CPF ou CNPJ e 26 não foi possível identificar CPF. Em relação a esses nomes, o COAF, no âmbito de sua atuação, incluiu na sua base de pesquisa como fonte de mídia. Ainda dentro de suas competências, os casos identificados pelo COAF com alguma atipicidade e passíveis de comunicação, foram comunicados às autoridades competentes.

Dos 54 CPF/CNPJ identificados, 31 constaram em Relatórios de Inteligência Financeira (RIF) desde a criação do COAF até os dias de hoje”.

Saiba como foi feita a série Panama Papers

Leia tudo sobre os Panama Papers

O que é e quando é legal possuir uma empresa offshore

Participaram da série Panama Papers no Brasil os repórteres Fernando Rodrigues, André Shalders, Mateus Netzel e Douglas Pereira (do UOL), Diego Vega e Mauro Tagliaferri (da RedeTV!) e José Roberto de Toledo, Daniel Bramatti, Rodrigo Burgarelli, Guilherme Jardim Duarte e Isabela Bonfim (de O Estado de S. Paulo).

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Peemedebista comprou helicóptero por meio de offshore, mostra Lava Jato
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Fernando Rodrigues

Documento apreendido é de Renata Pereira Britto, da Mossack

Caso envolve deputado Newton Cardoso Jr, do PMDB de Minas

Operação financeira nos EUA foi revelada pelos Panama Papers

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O deputado Newton Cardoso Jr (PMDB-MG)

Uma planilha apreendida pela operação Lava Jato mostra que o deputado federal Newton Cardoso Jr (PMDB-MG) usou uma empresa offshore sediada em Nevada (EUA) para comprar e vender um helicóptero.

Trata-se de um documento em formato digital, apreendida pela Lava Jato durante a fase Triplo X (deflagrada em 27.jan.2016). O documento estava com Renata Pereira Britto, funcionária da firma panamenha Mossack Fonseca no Brasil. Ela chegou a ser presa na Triplo X, e foi liberada 5 dias depois.

As informações são do repórter do UOL André Shalders.

Na semana passada, Renata e os outros funcionários da Mossack no Brasil foram indiciados pela PF.

O documento é uma carta de cobrança (“invoice”). A data é 12.fev.2013, quando o helicóptero foi vendido pela Cyndar Management LLC, a offshore registrada em nome de Newton Cardoso, para a IF Construções e Participações. Esta última empresa pertence a Inácio Franco, deputado estadual pelo PV de Minas Gerais.

Eis o documento apreendido pela PF. Os destaques em vermelho foram feitos pelos investigadores (clique na imagem para ampliar):

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O documento apreendido pela PF com Renata Pereira

A existência da offshore controlada por Newton Cardoso e a compra do helicóptero foram reveladas pela série Panama Papers em reportagem publicada no dia 4.abr.2016. O trabalho jornalístico é citado na investigação da Lava Jato.

“Nesse lastro, a análise das informações encontradas na mídia digital reforça o cenário investigativo ao desvendar uma planilha eletrônica referente à compra, em tese, desse mesmo helicóptero apontado pela equipe do Panama Papers”, escreveu o perito da PF. Leia a íntegra da análise da PF aqui.

Newton Cardoso não foi alvo da fase Triplo X, e nem é mencionado no relatório final da PF sobre a operação. Como os próprios policiais escrevem ao fim da análise, “a simples menção a nomes e/ ou fatos contidos neste relatório, por si só, não significa o envolvimento direto ou indireto dos citados em eventuais delitos objetos da investigação”.

A série Panama Papers, que começou a ser publicada em 3.abr.2016, é uma iniciativa do ICIJ (Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos), organização sem fins lucrativos e com sede em Washington, nos EUA. Os dados foram obtidos pelo jornal Süddeutsche Zeitung. O material ficou em investigação por cerca de 1 ano. Participaram do trabalho com exclusividade no Brasil o UOL, o jornal “O Estado de S.Paulo” e a RedeTV!.

HELICÓPTERO E FLAT EM LONDRES
Papéis da Mossack Fonseca, analisados para a série Panama Papers, mostraram tanto Newton Cardoso Jr. quanto seu pai, o ex-governador de Minas Newton Cardoso, utilizaram offshores em transações no exterior.

A Cyndar Management LLC, pertencente a Newton Jr, foi criada em 2007, no Estado americano de Nevada. Trocas de e-mails encontradas no acervo da Mossack Fonseca mostram que o objetivo da empresa era comprar um helicóptero, no valor de US$ 1,9 milhão (valores da época).

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Documentos de incorporação da Cyndar Manament, de Newton Jr.

O helicóptero é da marca Helibrás, modelo Esquilo AS350 B-2. Tem capacidade para 5 passageiros e autonomia de 3h de voo. Foi comprado de outra offshore, sediada nas Ilhas Virgens Britânicas. O equipamento foi arrendado à Companhia Siderúrgica Pitangui, de propriedade da família Cardoso, no fim de 2007.

A companhia continua ativa, segundo o registro da Mossack Fonseca. Em 2011, Cardoso decidiu vender a aeronave, o que acabou acontecendo só em 2013. O preço acertado foi de US$ 1 milhão. Como a aeronave foi vendida antes da 1ª disputa eleitoral de Newton Cardoso Jr, este não tinha necessidade de declará-la ao TSE.

Já Newton Cardoso, o pai, adquiriu uma offshore em out.1991, quando ainda era governador de Minas Gerais. A Desco Trading Ltd. foi usada para comprar um flat em Londres em jul.1992, pouco depois de Newton deixar o governo de Minas Gerais. O valor à época: 1,2 milhão de libras. Esse montante hoje (abril de 2016) convertido em reais equivaleria a aproximadamente R$ 6,3 milhões.

Documentos da Desco Trading mostram que o objetivo da companhia era receber aluguéis. Os valores deveriam ser depositados numa conta no Lloyds Bank de Londres.

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Documento da Desco Trading, de Newton Cardoso (pai)

OUTRO LADO
O deputado Newton Cardoso foi procurado pessoalmente e por meio da assessoria de imprensa na última 6ª feira (19.ago). Ele nega qualquer irregularidade.

Por meio da assessoria de imprensa, repetiu a mesma manifestação emitida quando da 1ª reportagem sobre o assunto. Disse ter recebido com “surpresa” as informações. Newton Cardoso Jr. “nega com veemência a existência de qualquer empresa offshore em seu nome ou mesmo de seu pai, o ex-deputado Newton Cardoso”.

Saiba como foi feita a série Panama Papers

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O que é e quando é legal possuir uma empresa offshore

Participam da série Panama Papers no Brasil na investigação sobre esportes os repórteres Fernando Rodrigues, André Shalders, Mateus Netzel e Douglas Pereira (do UOL), Diego Vega e Mauro Tagliaferri (da RedeTV!) e José Roberto de Toledo, Daniel Bramatti, Rodrigo Burgarelli, Guilherme Jardim Duarte e Isabela Bonfim (de O Estado de S. Paulo).

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PF conclui relatório da fase Triplo X e indicia dona do tríplex do Guarujá
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Fernando Rodrigues

Ex-presidente Lula e familiares não estão no indiciamento

Leia aqui a íntegra do relatório final da PF na fase “Triplo X”

Empregados da Mossack Fonseca no Brasil foram indiciados

Para PF, Mossack era “organização criminosa transnacional”

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O Condomínio Solaris, no Guarujá (SP)

A Polícia Federal entregou à Justiça na 6ª feira (12.ago) o relatório final sobre a fase Triplo X da Lava Jato, deflagrada em 27.jan.2016. Foram indiciados a publicitária Nelci Warken (que admitiu ser a verdadeira dona de um tríplex no Condomínio Solaris, no Guarujá) e funcionários da Mossack Fonseca no Brasil.

As informações são do repórter do UOL André Shalders.

O relatório final da PF foi tornado público pelo juiz Sérgio Moro no final da tarde de hoje (18.ago). Leia a íntegra aqui.

Além de Nelci, são arroladas Maria Mercedes Riaño (chefe do escritório da Mossack no Brasil), Luis Fernando Hernandez, Rodrigo Andrés Cuesta Hernandez, Ricardo Honório Neto e Renata Pereira Britto, que trabalhavam para a Mossack. Também é indiciado o empresário Ademir Auada, que intermediava negócios para a Mossack.

O ex-presidente Lula e seus familiares não foram indiciados. A real propriedade do apartamento do Guarujá, porém, é apurada em uma investigação à parte. A defesa do ex-presidente pediu a Sérgio Moro acesso à essa apuração na tarde de hoje (18.ago). Ainda não há decisão.

A Mossack Fonseca se tornou conhecida no Brasil após a divulgação da série jornalística Panama Papers, em abril deste ano. A série baseou-se em um acervo de 11,5 milhões de documentos internos da Mossack, obtido pelo jornal alemão “Süddeutsche Zeitung” e compartilhado com o Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos (ICIJ). No Brasil, participaram da apuração o UOL, o jornal “O Estado de S. Paulo” e a “RedeTV!”.

“ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA TRANSNACIONAL”
No documento de cinco páginas, a PF descreve a Mossack Fonseca como uma “organização criminosa de caráter transnacional, estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas, voltada para a prática do crime de lavagem de dinheiro”.

“As diligências efetuadas revelaram que a atividade principal da Mossack guardava relação com a abertura de empresas offshore, de forma a ocultar seus verdadeiros sócios e responsáveis. Nesse sentido, todos os que trabalhavam na empresa tinham plena ciência de que atuavam em um mercado voltado à demanda do trânsito de valores e bens de origem suspeita e duvidosa. Por tal motivo, foram indiciados como incursos no art. 1, par. 2º, inciso II da Lei 9.613/98”, diz outro trecho do relatório. A lei mencionada é a que trata de lavagem de dinheiro.

PANAMA PAPERS
A investigação jornalística dos Panama Papers é citada em vários momentos nos relatórios produzidos pela Polícia Federal. Em alguns trechos, os peritos da Polícia utilizaram-se de reportagens para analisar documentos apreendidos na sede da Mossack Fonseca e na casa das pessoas que foram alvo da fase Triplo X.

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Trecho de reportagem do Blog reproduzido em relatório da PF

P.S. (em 22.ago.2016 às 19h40) – Como informa a reportagem, as supostas irregularidades envolvendo o ex-presidente Lula continuam sob apuração em outro procedimento de investigação, que também tramita na 13ª Vara da Justiça Federal em Curitiba (PR).

Nelci Warken admitiu ser a verdadeira dona de um tríplex (o 163-B), que estava em nome de uma empresa offshore. Já o tríplex atribuído à família do ex-presidente Lula é o 164-A, no mesmo edifício.

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Parentes de Ricardo Magro adquiriram offshore com banco alvo da Lava Jato
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Fernando Rodrigues

Tio do empresário entra no foco da Lava Jato após 32ª fase

Ao todo, 44 offshores foram intermediadas pelo FPB Bank

Informações estão no banco de dados dos Panama Papers

Magro é amigo e ex-advogado do deputado Eduardo Cunha

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A refinaria de Manguinhos, no Estado do Rio de Janeiro

Familiares de Ricardo Magro, empresário investigado na Lava Jato e amigo do deputado afastado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), são donos de 4 empresas offshores abertas pela Mossack Fonseca e intermediadas pelo FPB Bank, alvo da 32ª fase da Lava Jato, batizada de Caça Fantasma. A operação foi deflagrada em 7.jul.

O banco FPB Bank, sediado no Panamá, atuava no Brasil sem autorização do Banco Central. A instituição é uma das dezenas de intermediários que operavam a venda das offshores abertas pelo escritório brasileiro da Mossack. Ao todo, o FPB Bank esteve relacionada com negociações de 44 empresas offshores para clientes brasileiros. Este dado é inédito para a força-tarefa sediada em Curitiba.

Vários dos compradores das offshores mediadas pelo FPB Bank forneceram endereços em bairros nobres de Fortaleza (CE). De acordo com os registros da Mossack Fonseca, o relacionamento comercial com o FPB Bank teria começado em 16.out.2014.

As 4 offshores estão em nome de Ernesto dos Santos Andrade (tio de Ricardo Magro), de sua mulher, Elisabete Leal da Costa Andrade, e do filho do casal, Cristiano da Costa Andrade. As empresas em paraísos fiscais foram abertas em 2015. As informações aparecem no banco de dados da série jornalística Panama Papers.

A série Panama Papers, que começou a ser publicada em 3.abr.2016, é uma iniciativa do ICIJ (Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos), organização sem fins lucrativos e com sede em Washington, nos EUA. Os dados foram obtidos pelo jornal Süddeutsche Zeitung e compartilhados com o ICIJ. O material foi investigado por mais de 1 ano. Participam desse trabalho com exclusividade no Brasil o UOL, o jornal “O Estado de S.Paulo” e a “RedeTV!”.

Contexto: o FPB é apenas um entre as dezenas de intermediários que ofereciam os serviços da Mossack Fonseca a clientes interessados em adquirir uma empresa offshore. No jargão desse mercado, este tipo de atravessador é conhecido como “client”. Outros agentes com a mesma atuação do FPB já foram alvos da Lava Jato: é o caso do empresário Ademir Auada e do doleiro Roberto Trombeta.

O uso de offshores é legítimo e garantido pela lei brasileira desde que a empresa e os bens e valores controlados por ela sejam declarados à Receita Federal e tributados.

RICARDO MAGRO
Ex-advogado de Cunha e também ex-defensor de seu tio Ernesto na Justiça, Ricardo Magro foi preso temporariamente no dia 24 de junho na Operação Recomeço da PF. Ele é acusado de participar da fraude de R$ 90 milhões no fundo de pensão da Petrobras, o Petros, e no dos Correios, o Postalis. Este último caso envolveu a compra de créditos (debêntures) do Grupo Galileo.

Magro pagou R$ 4,4 milhões de fiança e foi solto. Atualmente, o empresário responde por fraude e estelionato em uma ação penal na Justiça Federal do Rio decorrente da operação.

Magro também é proprietário da Refinaria de Manguinhos, alvo de inúmeras denúncias na Justiça por suspeita de ser utilizada para um esquema de fraudes no ICMS. A empresa deve cerca de R$ 4 bilhões aos Estados do Rio, São Paulo e Paraná.

O nome de Ernesto, tio de Magro, também apareceu nas investigações sobre a refinaria. Ele era proprietário da TM Distribuidora de Combustíveis, empresa que teria se beneficiado de um regime especial de recolhimento de ICMS estabelecido pelo Estado do Rio em 2002.

SISTEMA FINANCEIRO PARALELO
As investigações, que agora devem se aproximar dos parentes de Magro, fazem parte de uma nova frente aberta pela Lava Jato com a Caça Fantasmas. O foco é um sistema bancário paralelo, estruturado no Brasil por bancos estrangeiros legalmente constituídos em seus países, que seria usado para lavagem de dinheiro.

O FPB Bank Inc, do Panamá – que pertence ao banqueiro brasileiro Nelson Noronha Pinheiro, ex-sócio do Pine -, o PKB, da Suíça, e o Carregosa, de Portugal, são investigados pela força-tarefa da Operação Lava Jato por suposto uso de “representações” clandestinas para captação de clientes interessados em abrir contas secretas em paraísos fiscais.

O esquema, segundo suspeita a força-tarefa, teria sido usado por doleiros e operadores de propinas para ocultar dinheiro da corrupção descoberta na Petrobras e sob investigação em outros órgãos como Ministério do Planejamento, Ministério dos Transportes, Eletrobras e Valec –alvos de apurações em desdobramentos da Lava Jato, como Custo Brasil, Saqueador, O Recebedor.

“O perfil do cliente é de alguém que quer esconder a origem de seu dinheiro, porque senão não procuraria uma instituição ilegal. Todos que procuravam o serviço sabiam da situação”, afirmou o delegado da Polícia Federal Rodrigo Sanfurgo, da equipe da Lava Jato, em Curitiba.

Apesar de ser uma instituição legalmente constituída no Panamá, o FPB Bank e seus representantes não tinham licença do Banco Central do Brasil para cuidar de contas e de movimentações financeiras no País. Tudo era realizado em empresas brasileiras registradas em nome dos representantes do banco, como a Minucia Assessoria e Consultoria Financeira de Valores Mobiliários. Sete pessoas ligadas a ela foram alvos de condução coercitiva, no dia 7.jul.2016.

Os representantes do banco tinham canal direto com o escritório da Mossack Fonseca, no Brasil. Alvo da investigação Panama Papers, a empresa panamenha é especializada em abertura de offshores (firmas de gaveta, com sede fora do País) e passou a ser investigada sob suspeita de servir para lavadores de dinheiro.

Em fevereiro, o escritório brasileiro da Mossack, em São Paulo, foi alvo de buscas na Lava Jato. Uma offshore criada pela firma panamenha era detentora de um tríplex no edifício Solaris, no Guarujá, vizinho ao apartamento atribuído ao ex-presidente Lula, que chegou a adquirir uma cota do empreendimento, mas depois desistiu do negócio. A suspeita da Lava Jato é de que a offshore foi usada para ocultar patrimônio oriundo do esquema de corrupção na Petrobras.

Na ocasião, foi localizado um telefone criptografado para comunicação exclusiva entre seus funcionários e os representantes do FPB Bank. “Era um pacote completo porque a instituição financeira registrava as offshores, cuidava da parte gerencial da offshore, e ao mesmo tempo cuidavam da estruturação da conta fora do País para movimentar dinheiro”, explicou o delegado.

OUTRO LADO
A reportagem entrou em contato com os advogados de Ernesto dos Santos Andrade na última 5ª feira (21.jul). Foram encaminhados questionamentos sobre as offshores em nome de Ernesto e de seus familiares, mas ainda não houve resposta. Os advogados de Ricardo Magro não foram localizados.

Saiba como foi feita a série Panama Papers

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O que é e quando é legal possuir uma empresa offshore

Participam da série Panama Papers no Brasil na investigação sobre esportes os repórteres Fernando Rodrigues, André Shalders, Mateus Netzel e Douglas Pereira (do UOL), Diego Vega e Mauro Tagliaferri (da RedeTV!) e José Roberto de Toledo, Daniel Bramatti, Rodrigo Burgarelli, Guilherme Jardim Duarte e Isabela Bonfim (de O Estado de S. Paulo).

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Panama Papers vence prêmio global de jornalismo de dados
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Fernando Rodrigues

Premiação é concedida pela Global Editors Network

Investigação teve cerca de 400 jornalistas de 76 países
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A série Panama Papers recebeu ontem o principal prêmio internacional de jornalismo de dados, concedido pela Global Editors Network. O trabalho venceu na categoria “Investigação do Ano”.

Ao todo, participaram do processo de apuração 376 jornalistas de 109 veículos em 76 países. O material foi analisado ao longo de 1 ano. A força-tarefa de jornalistas debruçou-se sobre 11,5 milhões de arquivos do escritório de advocacia panamenho Mossack Fonseca, especializado em abrir empresas offshore.

Os dados foram obtidos pelo jornal alemão “Süddeutsche Zeitung” por meio de uma fonte anônima e compartilhados com o Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos (ICIJ, na sigla em inglês). No Brasil, participaram da investigação o UOL, o jornal “O Estado de S. Paulo” e a RedeTV!

No Blog, a série PanamaPapers resultou na publicação de 53 reportagens até o momento. Leia aqui todos os textos.

Na investigação, foram descobertas 107 offshores relacionadas à Lava Jato. Também foram encontradas várias empresas pertencentes a políticos e seus familiares. Offshores de diversos milionários brasileiros estavam nos arquivos, assim como de jornalistas e empresários da mídia.

A investigação identificou 214.844 pessoas jurídicas nos arquivos (entre offshores, fundações privadas, etc). Dessas, cerca de 1,7 mil pertencem a pessoas que informaram endereços no Brasil. A base de dados engloba o período de 1977 a dez.2015.

A análise das informações foi feita utilizando um algoritmo que permite confrontar a base de dados com planilhas de nomes. Conheça aqui os detalhes do processo de apuração.

No caso brasileiro, foram checados os seguintes grupos, entre outros:
– 551 pessoas que exerceram o cargo de deputado federal;
– 1.061 deputados estaduais eleitos;
– 1.404 juízes federais;
– 354 desembargadores;
– 30 mil servidores mais bem remunerados do Executivo federal;
– Todos os senadores e seus suplentes;
– Todos os diretores e ex-diretores da Petrobras;
– Citados e investigados nas operações Lava Jato, Zelotes e Acrônimo.

Possuir uma offshore não é ilegal desde que ela esteja devidamente declarada às autoridades e tenha seu patrimônio tributado. Saiba os detalhes aqui.

Participam da série Panama Papers no Brasil os repórteres Fernando Rodrigues, André Shalders, Mateus Netzel e Douglas Pereira (do UOL), Diego Vega e Mauro Tagliaferri (da RedeTV!) e José Roberto de Toledo, Daniel Bramatti, Rodrigo Burgarelli, Guilherme Jardim Duarte e Isabela Bonfim (de O Estado de S. Paulo).

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Auditor-chefe da ANP é acionista de offshore dos Panama Papers
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Fernando Rodrigues

Certificados de ações e procurações ligam auditor-chefe a empresa no Panamá

Antonio Carlos Neves de Mattos afirma desconhecer qualquer empresa em seu nome

Evento da 13ª Rodada de Licitações da ANP realizado em 7.out.2015

Por José Roberto de ToledoDaniel Bramatti, Douglas Pereira e Rodrigo Burgarelli

O chefe da auditoria da Agência Nacional do Petróleo (ANP) é citado nos Panama Papers como acionista único da offshore Ramelia Inc. –uma empresa de prateleira constituída pelo escritório Mossack Fonseca no paraíso fiscal do Panamá. Antonio Carlos Neves de Mattos aparece também como seu procurador plenipotenciário, autorizado a administrar a empresa, abrir e fechar contas bancárias, tomar empréstimos, comprar e vender em seu nome. Ele nega ter qualquer relação com a offshore.

Criada em 2007, a Ramelia Inc. foi vendida pela Mossack Fonseca ainda naquele ano, com a intermediação do Banco Safra Sarasin, de Luxemburgo. No princípio, as ações no valor de US$ 40 mil foram emitidas em quatro certificados ao portador. Mas, em 24 de novembro de 2015, passaram a ser nominais. Todos os 4 certificados passaram ao nome de Antonio Carlos Neves de Mattos, domiciliado à rua Maria Amalia, no Rio de Janeiro.

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Certificado que atribui ações da Ramelia Inc. a Antonio Carlos Neves Mattos

Embora seja inusual um funcionário público federal responsável por auditar empresas do setor de petróleo e combustível ser acionista de uma companhia em um paraíso fiscal, não há nada que o impeça de ser sócio de empresas –desde que declaradas ao Fisco. Porém, a lei 8.112, de 1990, proíbe os funcionários de “participar da gerência ou administração de sociedade privada”. Isso pode ser um problema para o chefe dos auditores da ANP.

Escrita em inglês, a procuração assinada pelos diretores da Ramelia Inc. indicados pela Mossack Fonseca em favor de Neves de Mattos explicita que o documento confere a ele poderes para agir individualmente “para gerenciar a corporação através de atos administrativos como tomar ou emprestar dinheiro, comprar produtos, mercadorias, ações e imóveis” entre outros bens e serviços. A lei 8.112, além de proibir a participação na gerência de empresas privadas, veda ao funcionário público “exercer comércio”.

A mais recente procuração em favor de Neves de Mattos –com validade de 5 anos– foi assinada em 15 de setembro de 2015 por Carmen Wong. Como sempre acontece com offshores criadas pela Mossack Fonseca, faz parte dos serviços prestados pelo escritório panamenho indicar diretores de fachada para constarem dos documentos da empresa. Wong é diretora de centenas de outras offshores, além da Ramelia Inc. Seu nome aparece 255 mil vezes nos documentos internos da Mossack Fonseca.

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Procuração assinada em 15 de setembro de 2015 que dá controle da Ramelia Inc. a Antonio Carlos Neves Mattos

A existência da Ramelia Inc. foi descoberta durante a análise dos cerca de 11,5 milhões de documentos resultantes do vazamento dos dados da Mossack Fonseca, que resultou na série Panama Papers, publicada pelo UOL. Os arquivos foram obtidos pelo jornal alemão Süddeutsche Zeitung e compartilhados com o Consórcio Internacional de Jornalismo Investigativo (ICIJ) e mais de 100 veículos de mídia do mundo todo. No Brasil, a investigação é feita por UOL, Estado de S.Paulo e Rede TV!.

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Cópia do passaporte de Antonio Carlos Neves Mattos presente nos registros da Mossack Fonseca

Entre os documentos encontrados pela reportagem nos arquivos da Mossack Fonseca estão cópias dos certificados de ações e da procuração que lhe dá “power of attorney” sobre a Ramelia Inc. e uma reprodução do passaporte de Neves de Mattos, válido até outubro de 2016. Ter uma offshore não é ilegal. No entanto, a legislação exige que ela seja declarada à Receita Federal e ao Banco Central se houver remessa de recursos para o exterior. No caso de Neves de Mattos, apenas uma investigação oficial teria poderes para comprovar se houve ou não alguma ilegalidade

OUTRO LADO
O chefe da auditoria da Agência Nacional do Petróleo (ANP), Antonio Carlos Neves de Mattos, afirmou que desconhece a existência de qualquer empresa offshore em seu nome. “Apesar de ter ciência que a simples propriedade de empresa offshore não é por si só ilícito, não possuo nenhuma associação a empresa offshore e independente disso sempre pautei minha vida e conduta com retidão, de forma totalmente compatível com a função que exerço na administração pública”, disse à reportagem.

Mattos diz morar em bairro de classe média e que seu estilo de vida e patrimônio – “devidamente declarado em meu Imposto de Renda” –são compatíveis com sua renda familiar. Segundo o Portal da Transparência, o salário bruto do auditor em abril deste ano foi de R$ 28.291,59. “Jamais aluguei ou possuí imóvel relacionado a empresas offshore, nem nunca possuí ou utilizei cartão de crédito de instituição financeira estrangeira. Tão pouco adquiri ou recebi bens de valores elevados, tais como objetos de arte, joias, carros luxuosos, etc. Também não possuo imóvel ou outras propriedades no exterior”, informou.

O auditor afirmou que é funcionário público de carreira concursado há 20 anos. “Em todos os cargos que exerci até a presente data, fui indicado exclusivamente por minhas qualificações técnicas e nunca exerci cargo do alto escalão da administração pública”. Ele não respondeu aos questionamentos da reportagem sobre por que seu nome e passaporte aparecem nas trocas de e-mail dos funcionários da Mossack Fonseca.

A ANP, procurada pela reportagem, não respondeu se há irregularidade ou não no fato de auditor da agência ser acionista e procurador de offshore. A agência afirmou apenas que o servidor nega qualquer vinculação da sua pessoa à empresa.

Segundo o Ministério da Transparência (ex-Controladoria Geral da União), órgão ao qual Mattos é originalmente vinculado, “pode-se afirmar, em tese, que a existência de uma conta no exterior não configura, por si só, um ilícito, desde que observadas as normas tributárias e financeiras, bem como aquelas relacionadas à observância, pelo servidor público, das exigências previstas na Lei 8.112/90.” Essa lei estabelece que é proibido a funcionários “participar da gerência ou administração de sociedade privada, personificada ou não personificada, exercer o comércio, exceto na qualidade de acionista, cotista ou comanditário”.

Segundo a ex-CGU, será necessária uma análise específica para verificar se houve utilização da empresa para benefício próprio em razão do cargo exercido. “Além disso, também seria necessária a avaliação quanto à real atuação do servidor como administrador da referida empresa. Em havendo indícios de comportamento indevido, o ministério atuará no sentido de fazer as investigações necessárias que o caso recomendar”.

Participaram da série Panama Papers os repórteres Fernando Rodrigues, André Shalders, Mateus Netzel e Douglas Pereira (do UOL), Diego Vega e Mauro Tagliaferri (da RedeTV!) e José Roberto de Toledo, Daniel Bramatti, Rodrigo Burgarelli, Guilherme Jardim Duarte e Isabela Bonfim (de O Estado de S. Paulo).

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Fonte anônima dos Panama Papers lança manifesto e propõe colaboração
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Fernando Rodrigues

“John Doe” se diz ser necessário proteção legal a vazadores

Dados foram oferecidos a jornais que decidiram não usá-los

Fonte alega não estar ligada a nenhum governo ou agência

Leia aqui neste post a íntegra do manifesto, em português

PanamaPapers-Front

A fonte anônima responsável pelo vazamento de 11,5 milhões de documentos da firma panamenha de advocacia Mossack Fonseca divulgou um manifesto ontem, 6ª feira (6.mai.2016). No texto, mostra disposição para colaborar com autoridades na resolução de casos de evasão de divisas.

Batizado de “A revolução será digitalizada” [“Revolution will be digitized”], o manifesto afirma que a fonte ofereceu os documentos a editores de outros meios de comunicação, mas eles não quiseram divulgá-los. A documentação também teria sido oferecida à organização Wikileaks,  que teria ignorado os avisos.

O texto foi entregue ao repórter Bastian Obermayer, do jornal alemão Suddëutsche Zeitung.

Em tom pessimista, a fonte faz críticas aos meios de comunicação, aos governos e à comunidade jurídica por suposta conivência com a sonegação fiscal e com a corrupção disseminada. O manifesto é assinado com o pseudônimo “John Doe”, expressão que significa “João Ninguém” em inglês.

Com um viés de esquerda, a fonte anônima afirma: “O resultado para a sociedade dessas falhas é a erosão completa dos padrões éticos, levando, no fim, a um novo sistema que nós continuamos chamando de capitalismo, mas que está muito mais para a escravidão econômica”.

A série Panama Papers, que começou a ser publicada em 3.abr.2016, é uma iniciativa do ICIJ (Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos), organização sem fins lucrativos e com sede em Washington, nos EUA. Os dados foram obtidos pelo jornal Süddeutsche Zeitung. O material está em investigação há cerca de 1 ano. Participam do trabalho com exclusividade no Brasil o UOL, o jornal “O Estado de S.Paulo” e a RedeTV!.

Leia abaixo a íntegra, em português, do manifesto de John Doe (aqui, em inglês):

A revolução será digitalizada

A desigualdade de renda é uma das principais assuntos do nosso tempo. Ela afeta a todos nós, no mundo todo. O debate sobre o a aceleração repentina da desigualdade perdura há anos. Políticos, acadêmicos e ativistas foram incapazes de impedir o aumento na concentração de renda, a despeito dos inúmeros discursos, análises estatísticas e de protestos pontuais. Mesmo assim, a questão persiste: por que? E por que agora?

Os Panama Papers oferecem uma resposta: corrupção massiva e persistente. E não é coincidência que a resposta venha de um escritório de advocacia. A Mossack Fonseca é bem mais que uma engrenagem na máquina da “gestão da riqueza”. A firma panamenha usou sua influência para criar e distorcer leis em vários países ao redor do mundo, de forma a proteger os interesses de criminosos ao longo das últimas décadas.

Tome-se como exemplo a ilha de Niue: a Mossack cuidou de todas as etapas da montagem de um paraíso fiscal. Ramón Fonseca e Jurgen Mossack tentaram fazer crer que as companhias de fachada [shell companies] montadas por sua empresa, às vezes chamadas de “veículos de propósito especial”, são como carros de passeio.

Mas vendedores de carros usados não escrevem leis. E, frequentemente, o único “propósito especial” dos “veículos” que a Mossack produz é a fraude em larga escala.

Empresas de fachada são frequentemente associadas ao crime de sonegação de impostos. O que os Panama Papers mostraram é que, apesar de não serem ilegais por definição, essas empresas são usadas para uma gama de crimes que vai muito além da sonegação.

Eu decidi expor as atividades da Mossack Fonseca por acreditar que seus fundadores, empregados e clientes precisam responder pelo papel que cumpriram nesses crimes, dos quais apenas alguns foram expostos até agora. Levará anos, possivelmente décadas, para que toda a extensão dos malfeitos da Mossack seja conhecida.

Ao mesmo tempo, um novo debate global sobre o tema emergiu, o que é animador. Ao contrário da retórica educada do passado, que cuidadosamente omitia qualquer indício de malfeito por parte da elite, o debate atual foca no que realmente importa.

Eu tenho alguns pontos a apresentar sobre este debate.

Quero deixar registrado que eu não trabalho com nenhum governo ou agência de inteligência, nem diretamente e nem sob contrato, e nunca trabalhei. Meu ponto de vista é totalmente particular, assim como foi minha decisão de compartilhar os documentos com o Suddëutsche Zeitung e com o Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos.

A decisão não se baseia em nenhum propósito político específico; apenas no fato de que eu conheço os documentos bem o suficiente para entender a dimensão das injustiças que eles descrevem.

A narrativa dominante na imprensa até agora explorou o escândalo do que é possível fazer, de forma legal, dentro do sistema [das offshores]. De fato, coisas escandalosas são permitidas por lei e precisam ser mudadas.

Mas não podemos perder de vista outro fato importante: a Mossack, seus fundadores e empregados violaram repetida e conscientemente uma miríade de leis mundo afora. Em público, eles alegam desconhecimento dos fatos, mas os documentos mostram que eles os conheciam em detalhes e agiam deliberadamente.

No mínimo, já sabemos que Jurgen Mossack mentiu diante de um tribunal federal em Nevada (EUA) e sabemos também que a equipe de TI da Mossack trabalhou para ocultar traços do perjúrio. Todos eles devem ser processados de acordo com a lei, sem privilégios.

Ao fim e ao cabo, milhares de denúncias podem resultar dos Panama Papers, desde que as autoridades possam acessar e avaliar o acervo de documentos. O ICIJ e seus parceiros decidiram, corretamente, que não repassariam os documentos às agências governamentais. Eu mesmo, porém, estou disposto a cooperar com as autoridades dentro das minhas possibilidades.

Há vários vazadores [whistleblowers] e ativistas nos Estados Unidos e na Europa que tiveram suas vidas destruídas depois de lançar luz em casos nos quais obviamente houve crime. Edward Snowden está retido em Moscou, exilado pela decisão do governo Obama de denunciá-lo pela violação da Lei de Espionagem [Espionage Act]. As revelações de Snowden sobre a NSA merecem honras de herói e um prêmio substancial, não banimento.

Bradley Birkenfeld recebeu milhões como prêmio por suas informações sobre o banco suíço UBS –e mesmo assim acabou condenado à prisão pelo Departamento de Justiça (dos EUA).

Antoine Deltour está sendo julgado por ter repassado a jornalistas informações sobre acordos tarifários secretos entre Luxemburgo e multinacionais. O país europeu ofereceu condições “de pai para filho” às empresas, resultando em perdas de bilhões de euros em impostos para os países vizinhos. E há dezenas de outros exemplos.

Vazadores legítimos, que expõe crimes inquestionáveis, merecem imunidade contra reações de governos. Até que os governos criem leis garantindo essa proteção aos que fazem denúncias anônimas, as autoridades dependerão de seus próprios recursos e das informações publicadas pela mídia.

É preciso que a Comissão Europeia, o Parlamento Britânico, o Congresso dos EUA e todos os demais países ajam de forma rápida não só para proteger os vazadores, mas também para dar fim aos abusos de firmas como a Mossack Fonseca.

Na União Europeia, os registros de empresas de todos os países membros deveriam estar acessíveis, com dados detalhados sobre os beneficiários finais.

O Reino Unido pode se orgulhar das iniciativas domésticas já tomadas até o momento, mas ainda há muito o que fazer para acabar com a opacidade financeira existente em vários de seus territórios ultramarinos, que são, sem dúvida, peças centrais para a corrupção mundo afora.

E os Estados Unidos não podem continuar confiando que seus 50 Estados tomarão decisões corretas sobre as informações corporativas. Já passou da hora de o Congresso entrar na discussão e forçar o aumento da transparência, estabelecendo padrões para a abertura e o acesso público.

Uma coisa é louvar as virtudes da transparência em fóruns governamentais. Outra totalmente diferente é implementá-la na prática. É um “segredo aberto” o fato de que, nos EUA, os representantes eleitos passam a maior parte de seu tempo coletando doações de campanha.

A sonegação fiscal jamais será eliminada enquanto os políticos dependerem de dinheiro dos mesmos que têm os maiores motivos para sonegar impostos dentre todos os segmentos da sociedade. Essas práticas políticas inadequadas fecharam um ciclo. O sistema de financiamento de campanhas dos EUA faliu e sua reforma não pode esperar mais.

Obviamente esses não são os únicos problemas. O primeiro ministro da Nova Zelândia, John Key, permaneceu estranhamente silencioso diante do papel de seu país em viabilizar a Meca da fraude fiscal que são as Ilhas Cook. Na Grã Bretanha, os Tories (partido conservador) não tiveram pudor em esconder o uso de empresas offshores.

Enquanto isso, Jennifer Shasky Calvery, diretora da Rede de Combate a Crimes Financeiros do Tesouro dos EUA, acaba de renunciar ao cargo. Ela trabalhará para o HSBC, um dos principais bancos do mundo (e não coincidentemente sediado em Londres). Milhares de beneficiários finais ainda ocultos de empresas offshores devem estar rezando para que o substituto dela no Tesouro seja igualmente desmotivado.

Em face da covardia política generalizada, há a tentação de render-se ao derrotismo e argumentar que o status quo continuará fundamentalmente intocado. Os Panama Papers são, se mais não fossem, um sintoma reluzente do tecido moral cada vez mais doente e apodrecido da nossa sociedade.

Mas a questão finalmente está sobre a mesa. Não é surpresa que uma mudança leve tempo. Durante 50 anos, os poderes Legislativo, Judiciário e Executivo ao redor do mundo falharam completamente em atacar os paraísos fiscais em metástase mundo afora. Mesmo hoje, o Panamá diz querer ser lembrado para além dos papéis [“for more than papers”], mas o governo, de forma conveniente, só examinou 1 cavalinho no carrossel das offshores.

Bancos, agências reguladoras do sistema financeiro e autoridades fiscais falharam. As decisões tomadas pouparam os ricos e concentraram0-se nos pobres e na classe média.

Tribunais retrógrados e ineficientes falharam. Juízes habituaram-se a aquiescer aos argumentos dos ricos, cujos advogados –e não só a Mossack Fonseca– são competentes em seguir a letra da lei enquanto fazem tudo o que podem para contrariar o espírito das normas.

A mídia falhou. Muitos veículos são hoje caricaturas do que já foram. A propriedade de jornais parece ter virado um hobby para bilionários, limitando a cobertura de questões sobre os ricos. O jornalismo sério carece de financiamento. O impacto é real: além do Süddeutsche Zeitung e do ICIJ, editores de vários outros grandes meios de imprensa analisaram os documentos do Panama Papers e decidiram não entrar na investigação. A triste realidade é que nenhuma das principais organizações de mídia do planeta se interessou em cobrir a história. Nem mesmo o Wikileaks respondeu a vários contatos seguidos.

Acima de tudo, a advocacia falhou. O sistema democrático depende de indivíduos responsáveis, espalhados por todo o sistema, que entendam e defendam a lei, não que a entendam para melhor explorá-la [em benefício próprio]. Na média, os advogados se tornaram tão profundamente corruptos que é fundamental que hajam mudanças profundas na profissão, muito além das propostas cosméticas já apresentadas.

Para começo de conversa, o termo “ética legal”, no qual se baseiam os códigos de conduta da advocacia, se tornou um oximoro. A Mossack Fonseca não trabalhava no vácuo –a despeito das multas e violações documentadas às regulamentações do setor, ela encontrava aliados e intermediários em grandes firmas de advocacia, em virtualmente todos os países.

Se a situação econômica decrépita da indústria da advocacia já não fosse evidência suficiente, agora não há mais como negar que advogados não podem regular uns aos outros. Isto simplesmente não funciona. Aqueles aptos a pagar mais sempre podem encontrar um advogado que sirva aos seus fins, esteja esse advogado trabalhando para a Mossack Fonseca ou para outro escritório ainda desconhecido para nós. E o restante da sociedade, como fica?

O resultado para a sociedade dessas falhas é a erosão completa dos padrões éticos, levando, no fim, a um novo sistema que nós continuamos chamando de capitalismo, mas que está muito mais para a escravidão econômica.

Neste sistema –nosso sistema atual– os escravos não sabem nem que são escravos e nem quem são seus mestres, que vivem num mundo à parte. Neste mundo, os grilhões intangíveis são escrupulosamente escondidos por camadas e camadas de “juridiquês” impenetrável. A magnitude dos danos deveria acordar a todos nós. O fato de ser preciso um vazador para soar o alarme deveria ser motivo de mais preocupação ainda. Isto mostra que os pesos e contrapesos [checks and balances] da democracia falharam, que o problema é sistêmico e que a desordem severa e disseminada pode estar bem próxima. É hora de agir de verdade e o primeiro passo é fazer as perguntas corretas.

Historiadores podem facilmente demonstrar como problemas envolvendo impostos e desequilíbrios de poder resultaram em revoluções no passado. Naquela época, a força militar era necessária para subjugar o povo. Hoje, restringir o acesso à informação é tão eficaz quanto ou mais, uma vez que a ação se dá, geralmente, de forma invisível. Mesmo quando vivemos em uma época na qual a armazenagem de dados online é cada vez mais barata e ilimitada e na qual as conexões à internet transcende as fronteiras nacionais.

Não é muito difícil ligar os pontos: do começo ao fim, da fundação até o impacto midiático global, a próxima revolução será digitalizada.

Ou talvez já tenha começado. 

Saiba como foi feita a série Panama Papers

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O que é e quando é legal possuir uma empresa offshore

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Panama Papers revelam elo de ex-advogado de Cunha com rede de offshores
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Fernando Rodrigues

Documentos mencionam 6 offshores de Ricardo Andrade Magro

Empresário nega irregularidades e fala que offshores são legais

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A refinaria de Manguinhos, de propriedade de Ricardo Magro

Por Rodrigo Burgarelli, José Roberto de Toledo, Daniel Bramatti e Guilherme Jardim. Com colaboração de Mateus Coutinho

O empresário e advogado Ricardo Andrade Magro tem sido figura recorrente nas páginas de revistas e jornais brasileiros. Primeiro, ganhou destaque no noticiário de negócios, quando, em 2008, comprou a Refinaria de Manguinhos, no Rio, e ensaiou uma milagrosa recuperação econômica do empreendimento.

Depois, passou a despontar em seções menos desejadas: amigo e ex-advogado do presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), Magro já foi relacionado a acusações de evasão fiscal na gestão da refinaria e a supostas compras de decisões na Justiça paulista. Seu nome apareceu agora em uma nova lista: a dos brasileiros que mantêm offshores em paraísos fiscais.

Nos documentos do Panama Papers, há menções sobre 6 offshores ligadas ao empresário paulistano, várias delas diretamente gerenciadas pela firma panamenha Mossack Fonseca, especializada em abrir empresas de fachada em paraísos fiscais.

Todas foram criadas em lugares que cobram pouco ou nenhum imposto sobre o patrimônio de pessoas jurídicas ou que facilitam a ocultação dos seus verdadeiros donos, como as Ilhas Cayman ou as Ilhas Virgens Britânicas. Três delas também aparecem ligadas ao escritório do banco HSBC em Mônaco, considerado um paraíso fiscal europeu, que procurou a filial suíça da MF para tratar da criação ou gestão dessas empresas.

Os papéis foram obtidos após a reportagem ter acesso a centenas de e-mails trocados entre a agente de Magro e a Mossack. As mensagens começaram a ser enviadas em maio de 2012. A agente em questão é uma funcionária da consultoria Intercorp, um grupo com sedes em Miami e Londres que afirma em seu site fazer “proteção de investimentos” de famílias ricas, “diversificando” a distribuição de recursos em diversos países para “mitigar obrigações tributárias”.

A série Panama Papers, que começou a ser publicada no domingo (3.abr.2016), é uma iniciativa do ICIJ (Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos), organização sem fins lucrativos e com sede em Washington, nos EUA. Os dados foram obtidos pelo jornal Süddeutsche Zeitung. O material está em investigação há cerca de 1 ano. Participam desse trabalho com exclusividade no Brasil o UOL, o jornal “O Estado de S.Paulo” e a RedeTV!.

No primeiro e-mail, a funcionária da consultoria Intercorp pede que a Mossack Fonseca abrs 2 offshores para o empresário com o objetivo de adquirir imóveis na Flórida de uso pessoal: uma nas Ilhas Virgens Britânicas e outra em Nevada, nos Estados Unidos. Os diretores seriam de fachada, nomeados pela firma panamenha.

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Documento de uma das offshores de Magro

RESTRIÇÕES
Após ser alertada pela Mossack de que a empresa americana não poderia ter diretores fictícios por causa da lei local, a agente então procede com a abertura apenas da primeira offshore. Ela acaba sendo incorporada poucos meses depois, sob o nome de Real Estate Assets and Investments Ltd.

No mesmo ano, outro agente da Intercorp entrou em contato com a Mossack para criar mais uma offshore, a Prime Assets Financial Investments Ltd.

Ela foi oficialmente aberta em 2013, e, assim como a Real Estate, teve sua diretoria formada por uma empresa especializada em oferecer diretores que representam a offshore apenas no papel. Magro é o único acionista da empresa.

Outras 3 offshores ligadas ao empresário são mais antigas. A Magro Investimentos S.A. foi criada em 2007 também nas Ilhas Virgens Britânicas, tendo Ricardo Magro Andrade como único diretor e acionista. O agente original, na época, era a filial de Mônaco do HSBC.

Foi essa mesma filial do banco que pediu a incorporação da Ronell Capital, que também foi estabelecida em 2007, mas no Panamá. Ela foi criada usando um mecanismo ainda mais secreto para ocultar o verdadeiro dono: suas ações não eram nominais, mas sim pertencentes “ao portador”. Ou seja, a qualquer pessoa que estivesse em posse dos papéis em um determinado momento.

A identidade de Magro, porém, aparece em um documento em que lhe é concedido poder para atuar em nome da empresa.

Também foi a filial de Mônaco do HSBC que pediu a criação da Engel Investimentos SA, estabelecida em 2007, nas Ilhas Virgens Britânicas.

A diretora e acionista da empresa é Alessandra Engel Magro, mulher de Ricardo e sua parceira de advocacia. Os nomes de ambos aparecem juntos como advogados em ações judiciais no Rio. Já a última offshore, chamada Hagora Investment Fund, é sediada nas Ilhas Cayman e não é operada via Mossack Fonseca.

Ela estava sendo usada para se tornar proprietária de algumas das offshores do casal, num processo que a agente da Intercorp descreveu como “reorganização da estrutura” de offshores de Magro.

A reportagem questionou o empresário sobre a legalidade das offshores. Ter empresas em paraísos fiscais não é crime no Brasil, desde que sejam declaradas às autoridades. Segundo Magro, essa declaração sempre foi feita durante o período em que ele foi residente no País.

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Passaporte de Ricardo Magro nos arquivos da Mossack Fonseca

O empresário afirmou que se tornou residente da União Europeia em 2012, já que também é cidadão português. Apesar disso, mantém um escritório de advocacia funcionando em São Paulo. “Todas as empresas que detinha à época que residia no Brasil sempre foram devidamente declaradas nos termos da legislação vigente”, afirmou.

Embora as offshores de Ricardo Magro fossem desconhecidas do público brasileiro, esse não é o caso da Refinaria de Manguinhos, empresa adquirida pela família do advogado em 2008. Ela foi acusada por uma Comissão Parlamentar de Inquérito da Assembleia Legislativa do Rio, em 2010, de ter comandado um esquema de evasão fiscal que causou R$ 850 milhões de prejuízo estimado àquele Estado.

Nesse escândalo, o nome do presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), acabou envolvido. Grampos autorizados pela Justiça encontraram o deputado prometendo interceder em uma questão comercial entre Manguinhos e a Braskem para beneficiar a empresa de Magro. O peemedebista sempre negou ter cometido irregularidades nesse episódio.

As acusações contra Cunha foram arquivadas em 2013. No ano passado, o promotor Rubem Vianna, do Ministério Público do Rio, também requisitou o arquivamento do inquérito policial que investigava Magro.

NOTICIÁRIO
O empresário teve o nome envolvido em  outro escândalo:  a Operação Têmis, da Polícia Federal, que investigava suposta compra de sentenças na Justiça Federal em São Paulo, em 2007. Magro foi denunciado por fraude processual, mas afirma ser inocente.

Além disso, o empresário diz estar tomando providências legais contra a revista IstoÉ por publicar em 2015 uma reportagem que o liga a um rombo de R$ 80 milhões no fundo de pensão dos funcionários dos Correios, o Postalis.

Segundo a revista, um conjunto de empresários teria montado um grupo chamado Galileo Educacional para assumir o comando de 2 universidades privadas que passavam por problemas financeiros e emitido debêntures (títulos de dívida).

O Postalis teria então comprado R$ 80 milhões desses títulos, que acabaram valendo praticamente nada após o Ministério da Educação ter descredenciado a maior parte dos cursos superiores do grupo. Segundo a revista, a polícia desconfiava que parte do dinheiro poderia ter ido parar nas contas de Magro, que apareceria como diretor do grupo.

OUTRO LADO
Questionado, o empresário negou a existência de qualquer irregularidade relacionada ao seu nome. Sobre a denúncia de evasão fiscal na Refinaria de Manguinhos, Magro afirmou que “o Ministério Público Estadual, após analisar todas as provas apresentadas, decidiu que não houve a prática de crime e determinou o arquivamento do feito”.

Em relação aos fatos da Operação Têmis, o empresário afirma que nem sequer foi “citado em nenhum dos casos relacionados” pelo Ministério Público Federal e que foi denunciado injustamente. Ele declara também que os autos estão conclusos para sentença e que seu advogado já pediu ao juiz celeridade na decisão.

Magro respondeu aos questionamentos sobre a menção do seu nome na reportagem da revista IstoÉ relacionada ao rombo no Postalis.

“O autor da reportagem pinçou meu nome porque um dos investigadores achou estranho –sem que tal estranheza conste de peça nenhuma do referido inquérito– eu ter investido meus recursos financeiros numa universidade, quando sou ligado ao setor de combustíveis”, disse.

Segundo ele, não há sua assinatura em qualquer documento relacionado ao grupo Galileo. Ele também negou ter tomado posse em qualquer cargo na empresa.

Saiba como foi feita a série Panama Papers

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O que é e quando é legal possuir uma empresa offshore

Participam da série Panama Papers no Brasil na investigação sobre esportes os repórteres Fernando Rodrigues, André Shalders, Mateus Netzel e Douglas Pereira (do UOL), Diego Vega e Mauro Tagliaferri (da RedeTV!) e José Roberto de Toledo, Daniel Bramatti, Rodrigo Burgarelli, Guilherme Jardim Duarte e Isabela Bonfim (de O Estado de S. Paulo).

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Eike controlava estrutura com 22 offshores da Mossack Fonseca
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Fernando Rodrigues

Firmas do ex-bilionário eram legais e declaradas à Receita

Empresário negociava diretamente com os panamenhos

Após ação da PF em 2008, Mossack decidiu cortar relações

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O empresário Eike Batista em audiência pública no Congresso, em novembro de 2015

O empresário Eike Batista controlava uma estrutura de 22 offshores montada pela firma panamenha Mossack Fonseca. Os dados sobre esse conglomerado estão em cerca de 1.300 arquivos que fazem parte da série Panama Papers.

As offshores de Eike foram declaradas à Receita Federal e ao Banco Central. São, portanto, legais. A reportagem checou os documentos. As empresas foram usadas para investimentos no exterior e também para a compra de bens de luxo, como o iate Spirit of Brazil VII.

A série Panama Papers, que começou a ser publicada no domingo (3.abr.2016), é uma iniciativa do ICIJ (Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos), organização sem fins lucrativos e com sede em Washington, nos EUA. Os dados foram obtidos pelo jornal Süddeutsche Zeitung. O material está sendo investigado há cerca de 1 ano. Participam desse trabalho com exclusividade no Brasil o UOL, o jornal “O Estado de S.Paulo” e a RedeTV!.

Eike Batista já foi o 7º homem mais rico do mundo, segundo a revista Forbes. Chegou a acumular uma fortuna de US$ 30 bilhões.

Das 22 offshores de Eike, 16 estavam nas Ilhas Virgens Britânicas, 2 nas Bahamas, 2 no Panamá. As restantes estavam na Samoa e na pequena ilha de Niue, no Pacífico.

As duas mais antigas são a Mayville e a Eurofina. Eram sediadas nas Ilhas Virgens e foram fundadas no mesmo dia: 20 de julho de 1989. Eike atuou como procurador da Mayville, e como presidente da Eurofina.

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Um advogado de Eike disse que as duas companhias foram criadas com o objetivo de captar investimentos pra atividades de mineração, porque muitos investidores internacionais consideram a legislação brasileira sobre o assunto “pouco confiável”. O representante mostrou documentos comprovando que ambas foram declaradas à Receita Federal.

Documentos das 2 empresas mostram vários depósitos em contas bancárias ao longo dos anos. Em 1994, US$ 272 foram depositados no Banque Scandinave en Suisse. No mesmo ano, em 1.nov, outros US$ 3 milhões foram enviados ao BBA Creditanstalt Bank Limited.

TEIA DE OFFSHORES
Nem todas as offshores, porém, estavam diretamente ligadas a Eike. Como presidente ou procurador, Eike atuava em 15 das 22 empresas. Em todas elas, quem operava em nome de Eike era a EBX Capital Partners, uma empresa brasileira pertencente a ele.

Como acionista, Eike Batista aparece nos documentos de apenas uma empresa, a EBX Panama SA. Ele possuía 86 ações, no valor de US$ 8,6 mil. Os acionistas minoritários eram executivos nas empresas de Eike no Brasil.

A Ardpoint, sediada nas Ilhas Virgens, por exemplo, tinha ações em nome de outra offshore, a Centennial. Já a Centennial era propriedade da WRM2 LLC, nos Estados Unidos.

A EBX Panama, segundo o advogado dele, foi criada para operar investimentos da siderúrgica EBX da Bolívia. Ele colocou 60 milhões de dólares no projeto, mas foi expulso do país em 2006, pelo governo de Evo Morales.

Em alguns casos o papel de procurador foi concedido para atos específicos. Na Kevington Foundation, por exemplo, Eike Batista foi nomeado para a compra da empresa Mare Cronium AS. A negociação, realizada em 2007, incluía o barco Spirit of Brazil VII. A embarcação ficou famosa por sediar festas na orla carioca.

A intermediação da EBX Capital Partners também faz com que o nome de Eike não apareça em todas as empresas. Algumas tiveram antigos dirigentes do Grupo X como procuradores.

É o caso da Ad Valorem, fundada em 2003 na ilha de Niue. Os procuradores da empresa são Flávio Godinho e mais 2 membros de sua família. À época, ele era executivo do conglomerado de Eike. Hoje, é vice-presidente de futebol do Flamengo.

eikeshares-editVia e-mail, Godinho disse que a offshore foi criada para operações financeiras ligadas à atividade de mineração, e que nunca teve participação de Eike. A mensagem ainda destaca que a Ad Valorem sempre foi uma “offshore do bem”.

ROMPIMENTO COM A MOSSACK
Em 2008, repentinamente, o escritório Mossack Fonseca se desligou de todas as offshores ligadas ao bilionário. Trocas de e-mails mostram que, em julho daquele ano, houve uma ordem de renúncia às 22 sociedades e fundações relacionadas à EBX Capital Partners.

A mensagem alertava: “Avisem a Genebra que o cliente pode reagir com violência”. O motivo do rompimento estava no assunto do e-mail: o título de uma reportagem sobre as relações de Eike com o governo do Amapá.

A reportagem tratava da Operação Toque de Midas, da Polícia Federal, que realizou buscas e apreensões na casa de Eike Batista. A investigação apontava que empresas do bilionário teriam sido beneficiadas com contratos da estrada de ferro do Amapá, em troca de doações à campanha de reeleição do governador do Estado.

Em um dos e-mails, a Mossack chega a declarar que a EBX Capital Partners, de Eike, é empresa “non grata” na firma panamenha.

Os documentos não revelam o destino das offshores de Eike. Mostram apenas que a operação delas pela Mossack foi completamente encerrada em 2008. A assessoria do empresário nega tenha sido iniciativa da Mossack de interromper as relações com o grupo.

E-mail enviado à reportagem afirma que a EBX continua a usar os serviços das grandes instituições financeiras, e também das 4 maiores auditorias do mundo. Conclui dizendo que parece estranha a afirmação, tendo em vista que é a Mossack Fonseca quem sofre acusações de práticas ilícitas.

Saiba como foi feita a série Panama Papers

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O que é e quando é legal possuir uma empresa offshore

Participaram da série Panama Papers  os repórteres Fernando RodriguesAndré ShaldersMateus Netzel e Douglas Pereira (do UOL), Diego Vega e Mauro Tagliaferri (da RedeTV!) e José Roberto de ToledoDaniel BramattiRodrigo BurgarelliGuilherme Jardim Duarte e Isabela Bonfim (de O Estado de S. Paulo).

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Mossack pagava comissão para advogados que conseguissem clientes no Brasil
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Fernando Rodrigues

Conheça detalhes da atuação dos panamenhos no Brasil 

Diretores “laranjas” custavam apenas US$ 200 a mais

Escritórios eram vitais para a estratégia da Mossack

155 bancas foram procuradas, mostram Panama Papers

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A Mossack também oferece vários “serviços jurídicos” em seu site

Escritórios de advocacia eram os principais alvo da Mossack Fonseca no Brasil. Pesquisa nos documentos da série Panama Papers revela que 1 entre cada 6 empresas que lidavam diretamente com a Mossack para tratar de clientes brasileiros de 2003 a 2015 era escritório de advocacia ou consultoria tributária.

Essas empresas são tão essenciais na estratégia comercial da MF para captar brasileiros interessados em abrir offshores em paraísos fiscais que, em contrapartida, recebiam até honorários para cada contrato assinado.

Há vários motivos pelos quais alguém busca abrir offshores em paraísos fiscais –e todos eles são usados pelos escritórios para atrair clientes. O principal deles é para economizar dinheiro, pagando menos impostos –o que nem sempre é ilegal.

Recursos colocados em paraísos fiscais muitas vezes não estão sujeitos a impostos locais, e por isso esses países podem ser uma opção interessante para sediar empresas que trabalham com comércio exterior. Leia sobre quando ter uma offshore é legal.

A série Panama Papers, que começou a ser publicada no domingo (3.abr.2016) é uma iniciativa do ICIJ (Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos), organização sem fins lucrativos e com sede em Washington, nos EUA. Os dados foram obtidos pelo jornal Süddeutsche Zeitung. O material está sendo investigado há cerca de 1 ano. Participam desse trabalho com exclusividade no Brasil o UOL, o jornal “O Estado de S.Paulo” e a RedeTV!.

OPERAÇÃO COMUM
Há uma operação comum para quem usa offshores: a transmissão de patrimônio e herança –pais podem transferir bens aos seus filhos caso eles sejam sócios ou beneficiários de uma mesma offshore sem ter que pagar imposto algum em países como as Ilhas Virgens Britânicas, por exemplo. É o que se chama, no jargão do Direito, de planejamento tributário e sucessório.

Nessas situações, não há motivo para esconder o nome dos proprietários da empresa a ser criada. Mas a ocultação do verdadeiro dono das empresas é um serviço oficial oferecido pela Mossack e que atrai muita gente interessada em não aparecer em registros oficiais.

Por apenas cerca de US$ 200 a mais, um possível cliente não precisa se preocupar em colocar seu nome ou de qualquer conhecido no quadro de diretores da empresa –são funcionários da MF que fazem esse papel. Eles também podem aparecer até como proprietários das ações da empresa, caso se pague outra taxa extra.

O verdadeiro dono, assim, não seria sequer dono da offshore no papel. Nesses casos, ele poderia ter apenas uma procuração em nome da empresa para decidir qualquer coisa: seja a abertura de uma conta bancária ou a destituição de qualquer um dos diretores ou mesmo dos acionistas de fachada providenciados pela Mossack.

No dialeto do mundo das offshores, essa prática é conhecida como “asset protection” (proteção de patrimônio, em inglês). Ela pode ser perfeitamente legal: uma empresa interessada em atuar em outro país pode querer entrar no novo mercado sem que abra todas as cartas e se identifique logo de cara para os seus concorrentes. Basta declarar a offshore no seu país de origem e pronto.

Mas a existência dessa possibilidade também dá ensejo para usos menos nobres. Há, aí, desde o empresário que quer esconder parte do seu dinheiro para protegê-lo de um futuro divórcio até gente sonegando impostos, ocultando patrimônio ou mesmo criando empresas em nomes de laranjas para driblar sanções internacionais.

IMPOSTOS
No caso brasileiro, a maior parte dos escritórios de advocacia que apresentaram clientes para a Mossack interessados em abrir companhias offshore são especializados na área de planejamento tributário.

Nos registros da firma panamenha, foram identificados pelo menos 1.284 offshores abertas por meio da sua filial brasileira (no total, mais de 210 mil empresas estão documentadas no Panama Papers). Escritórios de advocacia do país fizeram o trabalho de intermediação em ao menos 197 dessas offshores.

A companhia panamenha guardava registro das bancas com as quais mantinha relação. Entre os escritórios ativos que mais lhes apresentaram clientes estão Alessandro Dessimoni, responsável por 43 companhias, Gabriela Duva, por 39, Menezes e Abreu Advogados, com 30 clientes, e Zilveti e Sanden Advogados Associados, com 17.

“Há clientes que demonstram interesse em constituir empresas no exterior, no que não atuo. Nesses casos, encaminho-os simplesmente a escritórios especializados, dentre os quais Mossack Fonseca. Com essas apresentações, encerrava minha participação. Agia como se fora um corretor de imóveis, apresentando comprador ao vendedor, recebendo comissão, no caso de honorários”, explica a advogada Gabriela Duva.

Os outros 3 escritórios mencionados acima foram procurados pela reportagem, mas não se pronunciaram.

No Brasil, para chegar aos seu público-alvo, a MF realiza diversas reuniões de prospecção de novos parceiros para vender o seu produto. Os escritórios de advocacia são o foco desses esforços, por causa do seu potencial como intermediador de novos contratos.

De 2003 até janeiro deste ano, quando a Polícia Federal devassou o escritório brasileiro da Mossack Fonseca, a sucursal brasileira registrou 643 visitas de prospecção de clientes. Uma a cada quatro foi para escritórios de advocacia.

GRANDES MARCAS
Além dos clientes ativos, há registros de 155 escritórios que foram procurados pela Mossack Fonseca, mas não mantiveram nenhuma relação. Esses escritórios constam nos bancos de dados como clientes prospectados. Entre eles, encontram-se grandes escritórios do Brasil, como o “Pinheiro Neto Advogados”, “Mattos Filho, Veiga Filho, Marrey Jr. e Quiroga Advogados”, e “Barbosa, Müssnich & Aragão”.

A reportagem procurou todos para que pudessem comentar sua relação com a empresa panamenha. O escritório Pinheiro Neto confirmou que recebeu representante da Mossack em agosto do ano passado, para que a empresa pudesse apresentar seu portfólio de serviços, mas que a reunião foi corriqueira e que não resultou em qualquer tipo de cooperação ou relacionamento profissional.

O Mattos Filho afirmou que não tem registro da reunião e que a MF não é seu cliente. Os outros não se pronunciaram.

O recorde de prospecção de escritórios de advocacia foi em 2003 e 2004, mas a atuação da Mossack Fonseca continuou sem pausas e em ritmo intenso ao longo de toda a última década.

Como indicam os documentos, o “modus operandi” da MF consistia primeiro em visitar e fazer reuniões com possíveis parceiros. Nessa fase, são apresentados os serviços de abertura de offshores.

São mostradas também as opções de lugares para abertura: Nevada, Ilhas Virgens Britânicas, Seychelles, entre outras. Cada jurisdição proporciona diferentes condições de tributação e de confidencialidade de dados.

Além disso, a Mossack Fonseca também cobra taxas diferenciadas para cada. A aquisição de uma empresa no Panamá em 2010, por exemplo, poderia custar US$ 2.500, enquanto uma equivalente em Nevada saía por US$ 2.900.

Há também variedade nos serviços a serem escolhidos. O cliente pode optar pelo pacote mais simples –ou seja, paga apenas pelo serviço de “despachante” para que a MF abra a empresa no local desejado– ou pode ir atrás de produtos mais complexos.

Além do uso de diretores ou proprietários de fachadas, há a opção também de se comprar o que se chama de “empresa de prateleira” –uma offshore já criada há mais tempo (e talvez já usada por outro cliente) que ajuda ainda mais a ocultar a finalidade real do negócio.

Uma empresa do tipo em Seychelles, um arquipélago paradisíaco de 150 ilhas localizado no Oceano Índico, tinha preço promocional de US$ 1 mil em 2007, conforme indicam e-mails dos Panama Papers.

Criada a empresa, os clientes passavam a pagar anuidade para a manutenção da conta, que pode custar entre US$ 1000 e 2500 dólares, dependendo da jurisdição.

ENCONTRO COM O PRIMO DE MALUF 
Os relatórios de reuniões dos representantes locais da MF com os escritórios de advocacia são detalhados. Um deles relata a visita de uma agente da Mossack ao escritório do advogado Clóvis Antonio Maluf, que, nas palavras da funcionária, é responsável por um escritório que presta assessoria na área empresarial e que é primo do deputado federal Paulo Maluf (PP-SP).

A representante da Mossack comenta sobre os serviços de abertura de offshores –”o cliente se interessou bastante”– e entrega uma tabela de preços, com o valor de abertura para Panamá, Bahamas, Niue e Seychelles.

Segundo o relatório, o cliente afirmou já trabalhar com sociedades no Uruguai, país que na sua opinião era “muito seguro, com relação à abertura de informações confidenciais” e que já teve sérios problemas com jurisdições como Luxemburgo e Seychelles, pois “todas as informações sigilosas foram abertas para investigações”.

A visita termina com um presente: a agente da Mossack deixa um abridor de cartas e diz estimar em 100% a chance do cliente se tornar ativo.  Pelos registros da MF, entretanto, o negócio não veio a se concretizar.

“Devo dizer que fui procurado algumas vezes pela Mossack Fonseca, mas nunca fiz nenhum negócio com eles nem com empresas correlatas”, afirmou, por e-mail, Clóvis Maluf.

Participaram da série Panama Papers os repórteres Fernando Rodrigues, André Shalders, Mateus Netzel e Douglas Pereira (do UOL), Diego Vega e Mauro Tagliaferri (da RedeTV!) e José Roberto de Toledo, Daniel Bramatti, Rodrigo Burgarelli, Guilherme Jardim Duarte e Isabela Bonfim (de O Estado de S. Paulo).

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