Blog do Fernando Rodrigues

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Governo aceita repassar parcela maior de receita da repatriação a Estados
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Fernando Rodrigues

Mas medida só tem efeito se arrecadação passar de R$ 50 bi

Depois de chegar a esse valor, efeito de perda federal é mínimo

Henrique Meirelles soltou nota dizendo que não houve recuo

Para Fazenda, receitas com o programa serão de R$ 50 bi

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Alexandre Baldy (PTN-GO), relator da repatriação, com Michel e Marcela Temer

O Palácio do Planalto montou uma engenharia financeira para oferecer ajuda extra a Estados em dificuldades econômicas. Aceitou repassar uma parcela maior das receitas da repatriação/legalização de recursos de brasileiros no exterior depois que a arrecadação global atingir R$ 50 bilhões.

Hoje, os cálculos do Ministério da Fazenda e da Receita Federal indicam que dificilmente as receitas com impostos e multas sobre a repatriação chegarão a R$ 50 bilhões. Caso essa cifra não seja atingida, a medida que está programada para ser votada nesta 3ª feira (11.out.2016) ou nos próximos dias na Câmara será inócua para os Estados em dificuldade.

Leia aqui a íntegra do projeto que deve ser apreciado pelos deputados e que teve a relatoria de Alexandre Baldy (PTN-GO).

Para entender como vai funcionar a eventual ajuda aos Estados é necessário saber primeiro como é a regra hoje, segundo a lei 13.254, que criou a repatriação.

Quem entra no programa de repatriação paga 15% de imposto e mais 15% de multa sobre o ativo legalizado. Ou seja, um total de 30%. Isso não vai mudar. O que será alterada é a divisão desse dinheiro arrecadado pelo Fisco.

Se a regra em vigor fosse mantida, o que entrar de receita com multas vai integralmente para o caixa da União. Já os impostos precisam ser divididos, segundo determina o artigo 159 da Constituição: 51% ficam com a União e 49% vão para Estados e municípios.

Num exemplo hipotético de um contribuinte que repatriar o equivalente a R$ 100 milhões, a taxação total seria de 30%. Ou seja, R$ 30 milhões, cujo destino seria o seguinte:

R$ 15 milhões de receitas de multas para o governo federal
R$ 7,650 milhões de impostos para o governo federal
R$ 7,350 milhões de impostos para Estados e municípios

Pela nova proposta que está para ser votada, depois que a arrecadação global atingir R$ 50 bilhões, a regra a ser usada para impostos e multas será a mesma na hora da divisão do dinheiro. Ou seja, no exemplo acima, os R$ 30 milhões teriam o seguinte destino:

R$ 7,650 milhões de receitas de multas para o governo federal
R$ 7,350 milhões de receitas de multas para Estados e municípios
R$ 7,650 milhões de impostos para o governo federal
R$ 7,350 milhões de impostos para Estados e municípios

Quando se olha dessa forma, parece um bom negócio. Afinal, os Estados e as cidades dobram as fatias que recebem desse bolo.

Qual é o problema? A cifra de R$ 50 bilhões precisa ser atingida.

Hoje, o ministro Henrique Meirelles soltou a seguinte nota oficial: “Não abrimos mão do que prevemos arrecadar com a repatriação. O que tínhamos até agora é uma previsão de até R$ 50 bilhões. Estamos revisando essa projeção para saber se mantemos isso ou se vamos aumentar. Qualquer mudança de critério será para valores eventualmente arrecadados acima de nossa previsão“.

Ou seja, nos planos da Fazenda estão R$ 50 bilhões de receitas. Até recentemente, a arrecadação nesse programa estava muito baixa (menos de R$ 7 bilhões).

Nesta 2ª feira, a equipe econômica tentou fazer um “seguro” para uma eventual explosão de adesões ao programa de repatriação. Na negociação com a área política do governo, a Fazenda e a Receita Federal sugeriram elevar de R$ 50 bilhões para R$ 70 bilhões o valor mínimo a ser atingido antes de oferecer mais receita aos Estados e cidades. Não colou, pois o Planalto rejeitou a proposta –uma cifra tão alta poderia inviabilizar o acordo costurado entre deputados governistas e de oposição para votar as alterações na repatriação.

O consenso geral a respeito dessa mudança, segundo apurou o Blog, é que na hipótese (hoje remota) de a arrecadação passar de R$ 50 bilhões, sobrarão recursos para todos e o Planalto não enxerga prejuízo em conceder uma parcela maior para os Estados em situação de penúria financeira.

O que se pretendeu foi oferecer uma miragem para Estados endividados se animarem com a ideia. Ao mesmo tempo, produzir um amálgama entre oposição e governistas na Câmara, para facilitar a aprovação do projeto –deputados de todos os partidos querem tentar ajudar os governadores de seus Estados.

O próprio ministro da Fazenda preferiu ajudar passando a impressão de derrota no debate, para tornar mais crível a hipótese de benefício dos Estados.

O mais importante, na avaliação da área política, é flexibilizar um pouco as regras gerais da repatriação para atrair mais interessados em entrar no programa.

MUDANÇAS NA LEI
Além da eventual parcela maior de receitas a ser entregue a Estados e cidades, a regra que está para ser votada introduz 4 mudanças relevantes na repatriação, programa cujo nome oficial é Regime Especial de Regularização Cambial e Tributária (RERCT).

1) nova data para considerar o saldo no exterior: passa a ser 31.dez.2014. No momento, segundo advogados tributaristas e financeiros, há uma ambiguidade na regra que permitiria a tributação sobre o valor total movimentado ao longo de vários anos anteriores a 2014 –o que produziria um pagamento de imposto e multa inclusive sobre recursos já despendidos pelos brasileiros que desejassem entrar no programa.

2) anistia criminal: ficam eliminadas as ambiguidades a respeito. Com a nova regra, caso ainda não tenha sido dada uma “decisão criminal condenatória”, o cumprimento do que determina o programa de repatriação “extinguirá, em relação às condutas praticadas até a data de adesão, e nos anos anteriores, desde que relacionadas aos ativos regularizados, a punibilidade do declarante” em relação a uma lista de crimes.

3) devolução de parte da multa para quem trouxer dinheiro para o Brasil: os contribuintes que de fato trouxerem o dinheiro de volta para o Brasil (o programa também permite a regularização e manutenção do ativo no exterior, legalizado) poderão receber a “devolução de 25% do valor nominal pago a título de multa”. Para ter o benefício, o contribuinte deverá manter o valor repatriado no país por 3 anos, no mínimo, e aplicado em títulos do mercado financeiro no Brasil.

4) prazo para adesão: pula de 31.out para 16.nov.2016. Até porque, depois de eventualmente ser aprovado na Câmara, o projeto ainda precisa ser chancelado pelo Senado.

O QUE AINDA PODE SER ALTERADO
Deve ser apresentada uma emenda ao projeto de repatriação para permitir a adesão de políticos, servidores públicos e seus parentes.

Caso fracasse essa emenda, há uma ação no STF questionando essa proibição introduzida pela lei 13.254.

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Estados pedem empréstimo e oferecem receita de repatriação em garantia
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Fernando Rodrigues

Governadores fizeram apelo por ajuda a Michel Temer

14 Estados devem decretar “falência” nas próximas semanas

49% dos impostos com repatriação vão para Estados e cidades

Ideia é usar receita futura (e incerta) para receber dinheiro já

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Michel Temer, em 20 de junho, numa reunião com governadores de Estado

Governadores do Norte e do Nordeste querem uma saída heterodoxa para suas crises financeiras. Pressionam para que o governo federal conceda empréstimos aos Estados em situação pré-falimentar e aceite como garantia os recursos que vão entrar via programa de repatriação. O problema é que o dinheiro da repatriação ainda é completamente incerto.

Essa proposta foi vocalizada em uma reunião ontem (3ª feira) do ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, com 19 governadores (a maioria do Norte e do Nordeste). O czar da economia fez o seu papel. Disse não a todas as propostas oferecidas.

Os governadores então apelaram para seus aliados no Congresso, para que o presidente Michel Temer aceitasse a saída proposta. Uma reunião emergencial com Temer está para ser marcada ainda nesta semana.

O presidente do Senado, Renan Calheiros, foi pessoalmente ontem (3ª) à noite ao Planalto para tratar do assunto com Michel Temer. Hoje (4ª) cedo, Renan já conversou com o ministro Geddel Vieira Lima (Segov). Pauta: como conceder empréstimos emergenciais aos Estados aceitando a receita futura (e incerta) da repatriação como garantia.

Os governadores do Norte e Nordeste basicamente reclamam e pedem dinheiro por considerarem que não tiveram benefícios expressivos com o acordo de renegociação das dívidas. É que os débitos dos Estados dessas regiões são pequenos. Só se deu bem quem devia muito e teve um refresco com as novas regras. Por essa razão, Norte e Nordeste pedem ao governo federal um auxílio emergencial como compensação.

Não está claro se Michel Temer vai ceder ao apelo político dos governadores. O presidente da República não é, ainda, o responsável pela recessão econômica. Mas herdará a culpa pela atual situação se nada acontecer antes do final do ano. O quadro mais dramático está no Norte e no Nordeste. Em 14 Estados, há risco de falência nas próximas semanas, sem pagamento de salários nem repasses de verbas a órgãos públicos.

A economia no Brasil é fortemente dependente do dinheiro do Estado. No Norte e no Nordeste, essa dependência é ainda maior. Com centenas de milhares de funcionários públicos sem dinheiro, os setores de comércio e de serviços devem sofrer um forte impacto com menos recursos circulando.

O Blog apurou com operadores políticos no Congresso que Michel Temer terá de se equilibrar. De um lado, precisa manter o discurso de austeridade fiscal. De outro, tem de encontrar uma saída que dê oxigênio para o Norte e o Nordeste. Para um presidente com menos de 15% de aprovação, será uma catástrofe passar o seu 1º Natal no Planalto com metade os Estados brasileiros sem pagar salários aos seus funcionários.

O DINHEIRO DA REPATRIAÇÃO PARA OS ESTADOS
Ninguém sabe quanto a repatriação (programa que termina em 31 de outubro) trará de receita ao país. A estimativa otimista nas reuniões de ontem (3ª) à noite em Brasília era de R$ 70 bilhões. Metade desse dinheiro será via cobrança de imposto sobre o que será regularizado pelos contribuintes que aderirem ao programa. Os outros 50% virão por meio da aplicação de multa a quem desejar regularizar os ativos não declarados no exterior.

E quanto vai para Estados e municípios? O cálculo é complicado e embute alguma futurologia. Conforme determina a lei da repatriação, citando o inciso 1 do artigo 59 da Constituição, 49% do arrecadado em impostos (não em multas) vai para Estados e municípios. Se de fato a repatriação trouxer R$ 70 bilhões em receita para o país, metade disso (R$ 35 bilhões) será referente a impostos. Caberá aos Estados e municípios, portanto, a parcela de R$ 17,1 bilhões (49%).

É esse dinheiro que está sendo oferecido agora como garantia para os empréstimos imediatos que o governo federal faria a Estados em situação pré-falimentar. O problema é se depois os recursos da repatriação não se confirmarem. Nesse caso, o déficit da administração Michel Temer ficaria ainda mais fora do controle.

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