Blog do Fernando Rodrigues

Democracia seria mais justa com cláusula de desempenho

Fernando Rodrigues

Regra foi apelidada, erroneamente, de “cláusula de barreira”…

…STF derrubou a regra em 2006.

Leia análise do Blog:

A fragmentação partidária no país é um caso para estudo. Como podem os dois partidos que elegem presidentes sucessivos desde 1994 não ter pelo menos 5% dos votos para prefeito em todos os Estados em 2012?

O PT teve menos de 5% dos votos para prefeito em Alagoas, no Amazonas e em Roraima. O PSDB ficou abaixo desse percentual no Amapá, na Bahia, no Ceará, no Mato Grosso, no Rio de Janeiro, no Rio Grande do Norte e em Sergipe. O Blog publicou o número de votos obtidos por todos os partidos na eleição de 2012 em outro post: nenhum atingiu 5% nos 26 Estados.

Essa situação vai se manter “ad infinitum” exceto se o sistema de premiação dos partidos não for alterado com uma cláusula de desempenho.

A cláusula de desempenho, apelidada (equivocadamente) de “cláusula de barreira”, foi aprovada no Brasil em 1995. Era uma lei dura, mas dava (com justiça) uma década para os partidos se adaptarem. Valeria só a partir da eleição de 2006.

A regra estabelecia que os partidos só teriam amplo acesso ao Fundo Partidário e pleno funcionamento no Congresso (com estruturas para suas Lideranças) se obtivessem, ao menos, 5% dos votos para deputado federal no Brasil e 2% destes votos em, no mínimo, 9 Unidades da Federação.

Em 2006, partidos que dificilmente teriam esse resultado conseguiram que o STF considerasse a regra inconstitucional. O dispositivo foi derrubado. Foi uma página triste da história política brasileira. Ministros do STF acharam que a cláusula iria decretar a morte de algumas agremiações. Por essa razão, a norma estaria ferindo o princípio de livre associação política.

Foi uma decisão apaixonada do STF. E foi um equívoco, pois a cláusula não falava em fechar partidos, mas apenas em tratá-los de acordo com os votos que recebessem nas urnas.

O fato é que, agora, para que exista uma cláusula de desempenho no Brasil será necessário que a medida seja instituída por meio de uma emenda constitucional –ou seja, a chance é perto de zero.

Em 2006, fizeram carga contra a cláusula no Supremo vários partidos pequenos. Entre outros, estavam contra o dispositivo o PPS, o PC do B e o hoje “quase grande” PSB. A “Folha” registrou a sessão do STF no dia do julgamento (7.dez.2006).

É importante registrar sempre que a cláusula apenas tenta ordenar melhor o sistema partidário e nenhum será barrado –daí o erro de chamá-la de “cláusula de barreira”. O dispositivo existe em alguns países –a Alemanha, por exemplo. No caso brasileiro, não era para barrar, mas para medir o desempenho de cada um e dar um tratamento de acordo com o desejo dos eleitores.

História
A situação atual nasceu na volta do país para o sistema democrático, no início dos anos 80. Como a ditadura militar (1964-1985) havia dizimado os partidos, decidiu-se (acertadamente) facilitar a criação de novas siglas.

As regras eram lenientes para que, como talvez dissesse Mao Tsé Tung, florescessem as mil flores. Foi o que ocorreu. Hoje o Brasil tem 30 partidos, mas mais de 80 já foram abertos. O número hoje é 30 porque muitos foram fechados ou se fundiram com outras legendas.

É positivo que existam todos esses partidos. Seria bom se houvesse até muito mais. O que produz uma situação anômala não é o número de agremiações políticas, mas sim a continuação das regras facilitadas depois de 30 anos. Depois de todos esses anos, está claro que os que não tiveram competência (e votos) não merecem continuar recebendo tratamento privilegiado.

A regra atual é antidemocrática. Dá a várias siglas sem apoio da sociedade acesso a algo que é pago com o dinheiro de todos os brasileiros.

Tome-se o caso do PRTB, de Levy Fidelix. Foi criado em 28 de março de 1995. Tem pouquíssimo apoio dos eleitores. Na disputa pela Prefeitura de São Paulo, Fidelix foi candidato e defendeu (como sempre) a implantação de um aerotrem em São Paulo. Recebeu 19.800 votos (0,32%).

Ainda assim, pela lei atual, o PRTB de Levy Fidelix tem o direito de aparecer na TV a cada 6 meses em rede nacional. Transmite também mais vários minutos divididos em propagandas de 30 segundos em rede nacional. Tudo isso é também replicado em nível estadual. Ou seja, o PRTB difunde também o aerotrem separadamente em redes estaduais de TV a cada seis meses.

E quem paga isso? Os brasileiros e o dinheiro de seus impostos. É que as emissoras de TV são autorizadas a abater do imposto devido uma parte (considerável) do que deixam de faturar ao transmitir as propagandas partidárias.

Outro dado alarmante: o PRTB já recebeu neste ano de 2012 a bagatela de R$ 1,261 milhão do Fundo Partidário –um dinheiro estatal que todos os partidos recebem e é pago com os impostos dos contribuintes brasileiros.

Uma ressalva: este Blog defende 100% o direito do PRTB e de outros nanicos existirem. Que floresçam as mil flores. Mas não tem cabimento um partido que foi fundado em 1995 e nunca teve apoio popular continuar a receber dinheiro público na proporção que recebe o PRTB.

Aí é que entraria a cláusula de desempenho: o partido que não ultrapassar um determinado limite de votos em todo o país (e outro limite em um número mínimo de Estados) teria de ficar com acesso limitadíssimo à TV –digamos, um minuto por ano e só. E muito menos dinheiro do Fundo Partidário –talvez o suficiente para contratar um funcionário.

O que aconteceria com a cláusula? A democracia ficaria mais justa no Brasil. Os eleitores teriam à sua frente com bastante visibilidade apenas os partidos que de fato conseguem votos em nível nacional.

A cláusula, se um dia for adotada, também pode (e deve) servir para determinar quem deve obrigatoriamente ser convidado para debates eleitorais em TV. Pouparia os eleitores do espetáculo tragicômico de assistir a um trem fantasma de políticos sem expressão ao lado dos que de fato vão dirigir a cidade, o Estado ou o país.

A cláusula poderá oferecer um quadro com mais clareza aos eleitores. Ficará mais fácil entender quem de fato está no jogo.

Pode ser divertido assistir a malucos nos horários eleitoral e partidário fazendo propostas sem pé nem cabeça. Mas quem paga a conta são todos os brasileiros.

E quem tem depois de cooptar no varejo os votos de deputados e vereadores desses nanicos são os que chegam ao poder, às vezes em tenebrosas transações.

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