DEM é “inimigo de classe”, diz Luciana Genro
Fernando Rodrigues
Líder política do PSOL, ex-deputada rebate discurso conciliador de Clécio Luís, prefeito eleito de Macapá.
A ex-deputada federal Luciana Genro (PSOL-RS), uma das principais líderes do seu partido, envia carta para rebater os argumentos apresentados pelo prefeito eleito de Macapá, Clécio Luís.
Em entrevista ao ''Poder e Política'', Clécio, o primeiro prefeito eleito pelo PSOL em uma capital, disse não ver erro em receber apoio de qualquer partido político, inclusive do DEM. Dependente de ajuda do governo federal, ele também não fez críticas ao governo de Dilma Rousseff. Acesse os textos e vídeos da entrevista de Clécio Luís.
Luciana Genro constestou: ''Não rompemos com o PT para repetir o mesmo caminho. Por isso não aceitaremos alianças indiscriminadas com os partidos do governo Dilma, que são hoje os gerentes dos negócios do capitalismo brasileiro. Também não apresentaremos inimigos de classe como grandes aliados, como fizeram Clécio e o Senador Randolfe [Rodrigues, PSOL-AP] ao receber o apoio do líder do DEM em Macapá''.
A seguir, a íntegra da carta de Luciana Genro:
''Não rompemos com o PT para repetir o mesmo caminho''
Por Luciana Genro
Prezado Fernando Rodrigues,
Gostaria de fazer algumas considerações sobre a entrevista que o prefeito eleito Clécio Luís lhe concedeu no programa Poder e Política. Antes de mais nada registro minha avaliação de que o PSOL obteve uma grande vitória política e eleitoral. Nosso partido está ligado ao povo para poder cumprir seu dever de impulsionar as lutas sociais pelas demandas necessárias para melhorar a vida. Num momento em que o capitalismo encontra-se em crise e despejando sobre os trabalhadores, jovens e aposentados o peso desta crise, é decisivo avançar na mesma direção pela qual fundamos o PSOL: organizar um partido por uma nova política, conectada com as lutas anticapitalistas, independente, democrático e socialista.
Mas sempre que um partido aumenta seu peso social as pressões sobre seu rumo político aumentam. Até a classe dominante tenta incidir nas definições de sua linha estratégica. Com o crescimento do peso do PSOL, os debates sobre os rumos do partido tendem a ser tornar públicos. Vou aqui fazer um contraponto ao Prefeito Clécio porque considero que suas posições são bem minoritárias no partido. E seria muito ruim que posições minoritárias erradas apareçam como se fossem do PSOL. Não digo que foi esta a intenção do companheiro, mas se a mesma não tem um contraponto pode parecer assim.
Sobre a política de alianças do PSOL, o prefeito eleito diz que é “daqueles que defende que o PSOL deve ter uma política de reaproximação com o PC do B, com o próprio PPS, com o PV, com o PT”. Em seguida, em relação ao financiamento das campanhas, Clécio diz que a sua posição é de que “ nós podemos aceitar, sim, o financiamento, na atual conjuntura, de empresas e bancos”. Ao final, perguntado sobre uma avaliação do governo Dilma, Clécio limita-se a dizer que é uma continuidade de Lula, e mesmo diante da insistência do repórter nega-se a fazer um juízo sobre a qualidade do governo.
As três questões estão interligadas. É claro que o Prefeito tem todo o direito de propor mudanças no Estatuto e no Programa do PSOL. Mas afirmo, e tenho certeza que falo em nome da maioria da militância do PSOL , estas mudanças não passarão. Não passarão porque nós, que fundamos o PSOL, rompemos com o PT justamente por que este partido abandonou a defesa dos interesses dos trabalhadores. A reforma da previdência, cujo voto contra foi o estopim da nossa expulsão (minha, de Heloísa Helena, Babá e João Fontes), foi o ápice desta mutação do PT, que se transformou em um agente dos interesses do capital. O interesse dos bancos e empreiteiras em financiar o PT não aconteceu por acaso. Deu- se justamente por que o partido, ao ocupar prefeituras e governos estaduais, iniciou este processo de mudança de lado, consolidado ao chegar no gover no federal. Esta é a definição necessária, que Clécio não fez na sua entrevista.
Não rompemos com o PT para repetir o mesmo caminho. Por isso não aceitaremos alianças indiscriminadas com os partidos do governo Dilma, que são hoje os gerentes dos negócios do capitalismo brasileiro. Também não apresentaremos inimigos de classe como grandes aliados, como fizeram Clécio e o Senador Randolfe ao receber o apoio do líder do DEM em Macapá.
Bom exemplo dá o prefeito do PSOL eleito em Itaocara, RJ. Gelsimar Gonzaga anunciou que reduzirá o próprio salário, cortará cargos de confiança e garantirá a participação do povo em seu governo através de Conselhos Populares. A campanha do PSOL no Rio de Janeiro, onde chegamos a 30% dos votos, sem alianças espúrias e sem financiamento de empreiteiras e bancos , mostra que é possível sim uma disputa real pelo poder nas capitais sem mudar de lado.
Nossa atividade eleitoral – campanhas e eventuais vitórias – devem servir para que o PSOL demonstre o sentido da sua existência. Este sentido só é dado pela nossa prática de negação da velha política e pela construção de uma alternativa política e eleitoral que responda aos interesses da maioria do povo. Esta é a grande tarefa colocada para o PSOL, ainda mais desafiadora agora que conquistamos duas prefeituras. De minha parte aposto sempre que a influência da juventude combativa e dos trabalhadores em luta tenham peso cada vez maior nas definições estratégicas de nosso partido. Por isso sempre convido a todos estes para que participem dos comitês, núcleos e plenárias do partido, que tomem o PSOL para si, pois a participação ativa da militância é que pode assegurar um partido cada vez mais conectado com a luta anticapitalista.
Grata pela atenção, Luciana Genro.