Câmara deixa 108 PECs em limbo legislativo
Fernando Rodrigues
Propostas passaram pela CCJ e nunca foram adiante
Esse deve ser o destino da PEC contra o Poder Judiciário
Uma pseudocrise se instalou no noticiário e nas declarações de políticos e juízes quando uma exótica proposta de emenda constitucional tramitou na Câmara visando a diminuir a autonomia do Poder Judiciário. Era a PEC 33, que teve a sua admissibilidade aprovada em 24 de abril na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça).
A reação foi desproporcional ao que ocorreu quando mais de 100 PECs também passaram por esse mesmo ritual e nunca foram adiante. Muitas dessas propostas são esdrúxulas e quase tão despropositadas como a PEC 33 – que está quase enterrada no momento.
O fato é que a admissibilidade não garante nem um pouco o sucesso de uma proposta de emenda constitucional.
O Blog foi pesquisar e encontrou 108 propostas de emenda à Constituição que já passaram pela CCJ da Câmara e nunca prosperaram. A maioria ficou sem a comissão especial formada – esse é o passo seguinte na tramitação de uma PEC.
Essas 108 PECs represadas estão num limbo legislativo. Não são rejeitadas nem levadas adiante.
Entre as 108 propostas com esse status, 93 ainda aguardam a criação da sua comissão especial. Outras 15 já têm comissão, mas carecem da nomeação do presidente e dos três vice-presidentes para dar início aos trabalhos.
Excentricidades
Estão na fila PECs curiosas, como a de número 490/10. Seu autor é Efraim Filho (DEM-PB). Ele quer reservar um percentual de cargos e empregos públicos para os moradores de cidades de até 20 mil habitantes.
Outra ideia excêntrica é a PEC 53/07, de Jofran Frejat (PTB-DF). O político brasiliense desejava garantir aviso prévio e seguro desemprego ao servidor nomeado para cargos de confiança. Ou seja, ministros de Estado, por exemplo, não poderiam mais ser demitidos como hoje. O presidente da República teria de notificá-los e conviver mais um mês com o assessor antes de colocá-lo na rua.
A profusão de PECs indica duas obsessões dos políticos brasileiros. Primeiro, querem colocar todas as suas ideias dentro da Carta Magna. Segundo, enxergam o Estado como um ente provedor cujos recursos e os poderes seriam infinitos.
Cai dentro dessa categoria a proposta 101/11, de Márcio Macedo (PT-SE). Ele pretende inserir a garantia ao meio ambiente ecologicamente equilibrado como uma das metas da nação. Outra curiosidade é PEC 479/10, de Sebastião Bala Rocha (PDT-AP), que deseja incluir o acesso à internet em alta velocidade entre os direitos fundamentais do cidadão.
Outra ideia heterodoxa é a PEC 357/01, de autoria do Senado Federal, que estabelece imunidade tributária para cadernos escolares – numa época em que cada vez menos se escreve em cadernos.
A Constituição de 1988 tem como uma de suas características a prolixidade. O Brasil tinha vivido 21 anos de ditadura e os legisladores da época, para o bem e para o mal, preferiam escrever tudo o que consideravam ser direitos dos cidadãos.
No artigo 5º, está escrito que todos têm o “direito à vida”. O economista Roberto Campos, um crítico contumaz da Constituição de 1988, sempre fazia uma brincadeira a respeito: “Como a Carta me garante o direito à vida, vou entrar com um pedido de habeas corpus preventivo junto a Deus porque não quero morrer”. Campos morreu em 2001.