Brasil condena 31% dos réus em casos de corrupção
Fernando Rodrigues
Justiça do Maranhão é a que menos pune: só 3% são condenados
No Distrito Federal, taxa de condenação nesses processos é de 52%
Estados ainda têm 55,5 mil processos sobre corrupção esperando julgamento
Dados são preliminares e compreendem ações iniciadas até dezembro de 2012
O combate à corrupção no Brasil acaba de receber um dado estatístico inédito: 31% dos processos sobre corrupção nas Justiças estaduais (casos de improbidade e crimes contra a administração pública) tiveram condenação dos réus em julgamentos realizados de janeiro a julho deste ano de 2014.
Esse dado faz parte de um relatório do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) que acaba de ser divulgado e foi analisado em primeira mão pelo Blog.
A meta da Justiça nos Estados era julgar 86.418 processos de corrupção iniciados até dezembro de 2012. Até julho deste ano, tinham sido julgados 30.911 (ou seja, 36% do total). No universo das 19 unidades da Federação que informaram dados completos, houve 6.107 condenações (31%).
Não há como afirmar se esse percentual de condenações é baixo ou alto por uma simples razão: nunca na história do Poder Judiciário brasileiro essa estatística esteve disponível dessa forma.
É necessário também ressaltar que os dados –embora mais completos do que nunca– continuam precários. Só 19 das 27 unidades da Federação enviaram informações completas ao CNJ.
Quando se observam os locais para os quais há estatísticas disponíveis, já é possível notar quais Justiças estaduais estão melhor ou pior em comparação com a média do país.
O Tribunal de Justiça do Maranhão, por exemplo, informou ao CNJ ter julgado de janeiro a julho deste ano 1.030 processos de improbidade administrativa e crimes contra a administração pública iniciados até dezembro de 2012 e decidido pela condenação em 33 deles –taxa de 3%.
Esse baixo percentual de condenados por corrupção não é definitivo e deve ficar ainda menor. Os réus podem recorrer ao Superior Tribunal de Justiça e ao Supremo Tribunal Federal. A taxa de condenação por corrupção do Maranhão é a mais tímida entre os Estados compilados pelo CNJ.
O segundo Estado menos rigoroso com a punição de réus por corrupção é Alagoas, onde a taxa de condenação é de 12%. Até julho deste ano, o Tribunal de Justiça alagoano havia julgado 1.603 ações acumuladas sobre o tema. Em 199, houve condenação.
Não existem dados precisos sobre o período exato em que os processos sobre corrupção foram iniciados nos Tribunais de Justiça dos Estados –por essa razão é impossível dizer quanto tempo demorou para que esses casos fossem julgados.
Ainda assim, trata-se de uma rica estatística que antes não era conhecida no país. O Blog fez uma compilação dos dados disponíveis, mostrados na tabela a seguir (clique na imagem para ampliar):
86,4 MIL PROCESSOS DE CORRUPÇÃO
Como se observa na tabela acima, o estoque de processos sobre corrupção pendentes nos Tribunais de Justiça estaduais era de 86.418, para casos cuja tramitação teve início até dezembro de 2012.
Essa informação se refere à Justiça de 26 das 27 unidades da Federação –a única exceção é Mato Grosso.
Dos 86.418 processos, 30.911 foram julgados até julho deste ano de 2014. Ou seja, 36% foram analisados. Em agosto restavam ainda, pelo menos, 55.507 processos de corrupção esperando julgamentos nos Estados.
Por que “pelo menos” 55.507 casos? Porque esses são os processos iniciados até dezembro de 2012. De lá para cá não se sabe quantos mais começaram a tramitar.
Quando se trata da eficiência para zerar a pilha de processos antigos sobre corrupção, descobre-se um paradoxo. A Justiça de Alagoas, a segunda menos rigorosa para condenar nesses casos, é ao mesmo tempo a melhor do Brasil quando se trata de limpar as gavetas: os juízes estaduais alagoanos conseguiram analisar 93% dos 1.723 processos que estavam na fila naquele Estado.
É necessário cautela ao analisar esses dados. Não há informações qualitativas a respeito de como se deu o trâmite dos processos sobre corrupção em cada Estado. Só há números.
Ainda assim, essa quantificação é uma novidade na Justiça brasileira, cujas informações sempre foram historicamente obscuras ou inexistentes.
Todos os dados são preliminares e se referem a decisões proferidas no período de janeiro a julho deste ano no âmbito da Meta 4 de 2014 do CNJ. Essa meta foi aprovada pelos presidentes dos 90 tribunais brasileiros no 7º Encontro Nacional do Judiciário, em novembro de 2013. O objetivo é zerar, nas justiças estaduais, o estoque de processos sobre corrupção iniciados até dezembro de 2012.
O Tribunal de Justiça da Bahia é o mais atrasado no cumprimento da meta. Segundo o levantamento do CNJ, até julho apenas 427 processos dos 7.202 na fila haviam sido resolvidos –taxa de 6%.
A unidade da Federação mais rigorosa para condenar réus em processos de improbidade administrativa e crimes contra a administração pública é o Distrito Federal. Foram 421 condenações em um universo de 1.141 processos –taxa de 52%. A capital federal também registra um bom desempenho para zerar o estoque de ações. Até julho, havia decidido 71% dos processos antigos.
INFORMATIZAÇÃO ASSIMÉTRICA DA JUSTIÇA
Há muita assimetria na informatização do Judiciário e na disposição dos presidentes das cortes em colaborar com o CNJ. O Tribunal de Justiça de São Paulo ficou fora das estatísticas pois informou somente dados de processos de segunda instância, deixando lacunas sobre o desempenho da primeira instância.
O pior exemplo vem do Tribunal de Justiça do Mato Grosso, que até julho não havia informado nenhum dado ao CNJ.
O conselho esclarece que os tribunais não são obrigados a declarar suas estatísticas, mas há um compromisso assinado por seus respectivos presidentes para que façam isso.
A Meta 4 do CNJ é menos rigorosa com a Justiça Federal e o Superior Tribunal de Justiça. Para eles, o objetivo é julgar 100% das ações distribuídas até 31 de dezembro de 2011 e 50% das ações distribuídas em 2012.
O CNJ compilou os dados a partir de informações prestadas pelos próprios tribunais. O relatório completo, atualizado até setembro, será divulgado no VIII Encontro Nacional do Poder Judiciário, em 10.nov.2014, em Florianópolis.
E os dados do Supremo Tribunal Federal (STF), a mais alta Corte de Justiça do país? Não estão disponíveis para o CNJ. Por quê? Porque o STF não está submetido a ninguém e presta contas apenas da forma e quando desejar.
(Com Bruno Lupion)