Opinião: a reforma política reducionista e retrógrada da Câmara
Fernando Rodrigues
Deputados querem afastar ainda mais o cidadão da política
A Câmara dos Deputados aprovou o texto-base do projeto de lei da reforma política nesta quinta-feira (9.jul.2015). O que mais chama a atenção é a redução do tempo de campanha de 90 dias para 45 dias. Também foi desidratado o período de propaganda eleitoral no rádio e na televisão de 45 para 35 dias.
Por quê? Segundo os deputados, para reduzir o custo da campanha.
Trata-se de um pensamento retrógrado, reducionista e uma evidência de como os políticos brasileiros vivem num eterno divórcio da opinião pública.
É evidente que reduzir os gastos de campanha é uma decisão correta. Mas no raciocínio binário dos deputados funciona assim: menos dias de campanha, menos gastos de campanha.
Por essa lógica, por que não reduzir a campanha de uma vez para apenas uma semana? Ou por que não proibir de uma vez as propagandas, todas elas? A campanha ficaria (sic) de graça. Acabaria a democracia, mas essa é outra história.
Na linha do que estão para decidir (a proposta ainda precisa ser aprovada pelo Senado), em breve os congressistas vão abolir a campanha. O Brasil será o único país do planeta com eleições secretas.
Essas ideias de jerico não são novas.
Na década de 90, à guisa de reduzir os custos de campanha, foram proibidas as camisetas, bonés e outros itens que estão presentes em todas as eleições livres do planeta. “Havia abuso do poder econômico, com grandes empresas doando milhões de camisetas para alguns candidatos”, era a explicação da época. Em vez de punir o abuso econômico, reduziram a liberdade de expressão. Impediram milhares de candidatos modestos (e honestos) pelo interior do país de fazer suas campanhas imprimindo uma dúzia de camisetas na garagem de casa.
Também na década de 90 a campanha na TV e no rádio caiu de 60 para 45 dias. De novo, a intenção era reduzir custos. Agora, vai cair para 35 dias.
Nada está sendo feito a respeito da idiossincrasia mais demencial das regras eleitorais no Brasil: a que estipula datas para quase tudo.
No Brasil, vigora a hipocrisia. Até uma data determinada, o político tem de dizer que não é candidato. Em resumo, tem de mentir. À meia-noite, como num passe de mágica, ele se torna candidato e amanhece no dia seguinte fazendo campanha.
Por que um cidadão, seja ele quem for, não pode fazer campanha durante os 4 anos que antecedem uma eleição? A resposta é simples: quem já ocupa um cargo público tem interesse em que ninguém faça campanha, nunca. Com essa regra em vigor, é mais fácil ser reeleito vereador, deputado, senador, prefeito, governador ou presidente.
[Contexto e dica: à luz da Constituição, certamente seria considerado um atentado à liberdade de expressão proibir alguém de se declarar candidato a qualquer tempo ou de fazer camisetas para promover sua candidatura. Se alguma entidade entrar com uma ação no Supremo Tribunal Federal, terá chance razoável de derrubar todas essas regras]
No planeta inteiro a tendência no século 21 é a de haver uma promoção de maior participação dos cidadãos no processo político. No Brasil, sob o sofisma da redução de custos, o Congresso quer os cidadãos cada vez mais longe da política.
Está quase aprovado o aumento dos mandatos de 4 para 5 anos para todos os cargos eletivos. E, possivelmente, de 8 para 10 anos para os senadores.
Em vez de votar mais, os brasileiros passarão a votar menos (as eleições vão ocorrer entre intervalos de tempo mais longos) se vingar essa reforma política estapafúrdia que o Congresso está prestes a aprovar.
E impedir reeleições sem limite para vereadores, deputados e senadores? Nem pensar.
E reduzir o número excessivo de deputados (513)? Nem pensar. Afinal, por que o Brasil teria apenas, digamos, 435 deputados federais como os Estados Unidos? O Congresso brasileiro nunca vai se submeter a tal rebaixamento (sic).
E reduzir o número de senadores de 3 para 2 por unidade da Federação? Claro que não. Isso é coisa para os Estados Unidos, país no qual cada Estado tem apenas 2 senadores.
E acabar com a indecência de senadores suplentes, sem voto, que financiam a campanha do titular apenas com a promessa de assumir o mandato em algum momento? Nem pensar.
E cláusula de desempenho real, para valer, de maneira a impedir que partidos de aluguel tenham acesso quase indiscriminado à TV e ao rádio? Jamais! Os nanicos (há exceções) estão aí para isso mesmo –prestar um serviço sujo para quem estiver disposto a pagar o preço certo.
Em resumo, quando se observa o que a Câmara tem votado, fica cada vez mais verdadeira aquela frase derrogatória: “Toda vez que um deputado tem uma ideia, o Brasil piora”.