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Em 2014, “distritão” teria jogado no lixo até 39 milhões de votos
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Fernando Rodrigues

Sistema desperdiçaria 40,2% dos votos para deputado federal

As 513 cadeiras da Câmara teriam sido preenchidas com 58,1 milhões de votos

O sistema eleitoral conhecido como “distritão” é fácil de explicar, mas difícil de defender.

O que é o distritão? Em uma frase: um sistema no qual o candidato a deputado que tiver mais votos ganha a vaga. Simples.

São Paulo tem 70 das 513 vagas de deputado federal na Câmara. Os 70 mais bem votados numa eleição ficam com as 70 cadeiras.

Muito simples.

Mas é importante aplicar esse modelo sobre uma eleição recente, a de 2014, para saber de fato o que aconteceria.

Em 2014, votaram para deputado federal no Brasil 97,2 milhões de pessoas. Nesse grupo, 58,1 milhões votaram diretamente em um deputado que acabou eleito. Outros 8,1 milhões preferiram escolher apenas uma legenda ao digitar o voto na urna.

Para este exercício estatístico, considera-se os 513 deputados eleitos pelo atual sistema, conhecido como proporcional. Eles não foram necessariamente os mais votados.

A conta a ser feita é a seguinte:

Total de votos para deputado (nome ou legenda) em 2014: 97,2 milhões
Total de votos recebidos só pelos 513 eleitos: 58,1 milhões
Diferença: 39,1 milhões

No “distritão”, portanto, 39,1 milhões de votos de eleitores brasileiros na disputa pela Câmara dos Deputados –ou 40,2% dos que votaram– seriam jogados no lixo.

A Câmara, conhecida como “Casa do Povo”, representaria de maneira direta apenas 58,1 milhões de votantes –40,9% do eleitorado total do país. O Brasil tinha 142,8 milhões de eleitores aptos a votar em outubro de 2014.

No sistema atual, todos os votos contam. Uma vez que o eleitor digita o número de um candidato ou apenas o da legenda, essa escolha é contabilizada. Todos os votos são somados para o partido e sua coligação –e essa agremiação recebe um número de cadeiras proporcional ao apoio que conquistou nas urnas.

Os dados estão na tabela abaixo (clique para ampliar):

Arte

Os defensores do “distritão” podem argumentar que o cálculo acima é falacioso.

Primeiro, porque os votos em legenda –como existem hoje– deixariam de ser uma opção. Ou seja, em teoria, os 8,1 milhões de brasileiros que votaram num partido (e não em um candidato) em 2014 certamente escolheriam alguém nominalmente se o “distritão” fosse adotado.

É impossível saber como se comportaria no sistema “distritão” o eleitor que usualmente apenas vota em legendas. Votaria em branco? Nulo? Escolheria algum candidato?

Apesar das dúvidas, é possível testar uma hipótese. Se todos os que votaram só na legenda em 2014 tivessem escolhido um candidato vencedor. Hipótese altamente improvável, mas serve para se chegar aos números abaixo:

Votos para deputado em 2014 (nome e legenda): 97,2 milhões
Votos dos 513 eleitos, mais os votos em legenda: 66,2 milhões
Diferença: 31 milhões

A Câmara dos Deputados ainda estaria sendo representada por pessoas escolhidas por uma parcela menor do que o total do eleitorado.

No sistema proporcional alguns votos em candidatos e partidos também podem resultar inúteis, quando uma legenda não consegue eleger ninguém. Mas o volume desses votos é mínimo na comparação com o total.

Em 2014, 32 partidos lançaram candidatos a deputado federal. Desses, 28 elegeram representantes para a Câmara. Os 4 partidos que não conseguiram chegar ao Congresso (PSTU, PCO, PCB e PPL) tiveram um total de 409.675 votos “inúteis” para deputado federal.

É apenas 0,4% de todos os eleitores que votaram para deputado –e meros 0,3% sobre o eleitorado total do país na eleição de 2014.

Por todos os ângulos, o “distritão” é um sistema muito mais excludente da vontade geral dos eleitores do que o modelo proporcional, em vigor no Brasil desde 1945.

O grande defeito do modelo proporcional não é sua lógica inicial (considerar todos os votos da imensa maioria dos eleitores). O problema foram as anomalias agregadas por meio de deformações bem brasileiras. A principal delas é a permissão para partidos se coligarem em eleições proporcionais.

Como um partido democrata-cristão pode se aliar a uma sigla marxista, as coligações permitem que um cristão conservador e anti-aborto acabe elegendo um liberal a favor da liberação das drogas. E vice-versa.

Sem as coligações, muitos partidos de aluguel deixariam de existir. As alianças seriam feitas apenas em momentos de decisões concretas, dentro do Congresso (ou nas Assembleias Legislativas e Câmaras de Vereadores), como em democracias mais maduras.

Em 2 ciclos eleitorais (8 anos), haveria uma grande profilaxia no quadro partidário.

Estaria pavimentado o caminho para a adoção de uma cláusula de desempenho para os partidos. Esse dispositivo já foi tentado por meio de uma lei, mas acabou derrubado pelo STF, que entendeu ser necessária uma emenda constitucional.

Com uma cláusula de desempenho seriam eliminadas assimetrias hoje existentes na distribuição do tempo de TV e no acesso aos recursos do Fundo Partidário. No momento, partidos estabelecidos como PT, PSDB ou PMDB têm 10 minutos de programa partidário a cada 6 meses. Siglas inexpressivas, como o PRTB de Levy Fidelix, têm 5 minutos na TV a cada semestre.

É evidente que essa distribuição está errada e não reflete o desejo dos eleitores nas urnas.

A cláusula de desempenho (dar a cada partido de acordo com o seus votos no país inteiro) parece o caminho óbvio a ser seguido. Mas a viabilidade de sua aprovação só se consubstancia após a criação de uma espécie de cordão sanitário no Congresso, com o fim das coligações em eleições para deputados.

Abaixo, um vídeo didático sobre o “distritão” e o sistema atual:

(Com Bruno Lupion)

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