Blog do Fernando Rodrigues

“Eu fico com pena do FHC”, diz Lula

Fernando Rodrigues

Petista acusa tucano de torcer contra o Brasil.

Para ex-presidente, Campos é o adversário com mais chances; Aécio, com menos.

Ser mulher é barreira para Dilma se relacionar com políticos e empresários, opinou em entrevista ao “Valor”.

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) afirmou ao jornal “Valor Econômico” que sente pena do adversário e antecessor Fernando Henrique Cardoso (PSDB). Segundo ele, o tucano viaja “falando que o Brasil não vai dar certo”.

“Você sabe que eu fico com pena de ver uma figura de 82 anos como o Fernando Henrique Cardoso viajar falando que o Brasil não vai dar certo. Fico com pena”, disse Lula às entrevistadoras Vera Brandimarte, Cristiane Agostine e Maria Cristina Fernandes. A íntegra da entrevista está disponível na internet para assinantes do “Valor”.

O bate-boca público entre petistas e tucanos ficou mais intenso a partir de 20.fev.2013. Na ocasião, Lula lançou a presidente Dilma Rousseff como candidata à reeleição na festa de 33 anos do PT e a própria Dilma disse não ter recebido nenhuma herança dos governos de FHC. No mesmo dia, no Senado, o pré-candidato do PSDB ao Planalto, Aécio Neves, listou “13 fracassos” do PT.

A declaração de Lula sobre FHC ao “Valor” foi dada em resposta a uma pergunta sobre dois escândalos associados a ele depois do fim de seu mandato de presidente da República: a Operação Porto Seguro e as viagens ao exterior financiadas por empreiteiras.

No primeiro caso, Rose Noronha, pessoa da confiança de Lula e sua ex-chefe de gabinete em São Paulo, foi acusada pelo Ministério Público de integrar uma quadrilha de venda de pareceres do governo para beneficiar entes privados.

No caso das viagens, a “Folha” revelou que quase metade delas, feitas ao exterior após o fim do mandato presidencial, foram pagas por empreiteiras com interesses nos países visitados.

Em sua defesa, Lula disse ao “Valor” que “não liga” para coisas “feitas de muito baixo nível, quando parecem mais um jogo rasteiro”.  Sobre as viagens, afirmou: “O que faz um presidente da República? Como é que viaja um Clinton? A serviço de quem? Pago por quem? Fernando Henrique Cardoso? Ou você acha que alguém viaja de graça para fazer palestra para empresários lá fora? Algumas pessoas são mais bem remuneradas do que outras. E eu falo sinceramente: nunca pensei que eu fosse tão bem remunerado para fazer palestra. Sou um debatedor caro. E tem pouca gente com autoridade de ganhar dinheiro como eu, em função do governo bem-sucedido que fiz neste país”.  E, antes de disparar contra FHC, disse: “Se alguém tiver um produto brasileiro e tiver vergonha de vender, me dê que eu vendo. Não tenho nenhuma vergonha de continuar fazendo isso. Se for preciso vender carne, linguiça, carvão, faço com maior prazer. Só não me peça para falar mal do Brasil que eu não faço isso”.

Eleição de 2014
Na entrevista ao “Valor”, Lula disse que a prioridade do PT no próximo ano será a reeleição de Dilma Rousseff. E falou sobre os casos de Rio e São Paulo, estados em que governistas estão rachados sobre quem deve ser o candidato.

No Rio, disse, o senador Lindbergh Farias (PT-RJ) pode ser candidato sem prejudicar a aliança com o PMDB, partido chave para a reeleição de Dilma. Os peemedebistas fluminenses pretendem lançar o atual vice-governador Fernando Pezão. Em São Paulo, Lula disse que é preciso fechar aliança com o PSD, de Kassab, com o PTB, de Campos Machado, e com o PMDB, de Michel Temer e Gabriel Chalita. E citou como possíveis candidatos petistas ao governo paulista os ministros Aloizio Mercadante (Eduação), Alexandre Padilha (Saúde), Marta Suplicy (Cultura) e José Eduardo Cardozo (Justiça), além do prefeito de São Bernardo do Campo Luiz Marinho.

Adversários da presidente
Lula falou ao “Valor” sobre as possíveis candidaturas de Eduardo Campos (PSB), Marina Silva (Rede) e Aécio Neves (PSDB) à Presidência da República. Deu a entender que Campos é o oponente de Dilma com mais condições de se viabilizar, enquanto Marina “não tem nem partido” e Aécio é o que tem “mais dificuldades de se viabilizar”.

O petista disse que sua amizade com Eduardo Campos não será abalada por desavenças eleitorais e que não pedirá que ele deixe de ser candidato. “[Eduardo] termina seu mandato no governo de Pernambuco muito bem avaliado. Me parece que não tem vontade de ser senador da República nem deputado. O que é que ele vai ser? Possivelmente esteja pensando em ser candidato para ocupar espaço na política brasileira, tão necessitada de novas lideranças. Se tirar o Eduardo, tem a Marina que não tem nem partido político, tem o Aécio que me parece com mais dificuldades de decolar. Então é normal que ele se apresente e viaje pelo Brasil e debata. Ainda pretendo conversar com ele. A Dilma já conversou e mantém uma boa relação com ele”.

Sobre Aécio, o ex-presidente falou pouco. Mas foi afiado. Além de classificar a candidatura do tucano como a mais difícil de decolar, disse que não vê “ninguém de direita na disputa” pelo Planalto em 2014. A frase é ambígua. Com boa vontade, entende-se que Lula não considera Aécio um político de direita. Mas tanto ele quanto o PT não perdem chance de taxar o PSDB e todos seus integrantes como os representantes da direita brasileira. Ou seja, para Lula, o PSDB sequer tem chances de concorrer com Dilma no momento.

Perfil de Dilma
Lula demonstrou na entrevista que ainda goza de proximidade com sua ex-ministra da Casa Civil. Ao responder sobre suposta dificuldade de relacionamento dela com empresários, deu a entender que tem liberdade para telefonar para ela quando bem entende: “Se alguém ainda aposta no fracasso da Dilma, pode começar a quebrar a cara. Ela tem convicção do que quer. Esses dias liguei para ela e disse para tomar cuidado para não passar dos 100%”.

Ainda na resposta sobre o relacionamento de Dilma com empresários, o petista soltou um comentário a respeito de uma característica da presidente que o governo e ela mesma se esforçam para rechaçar: a de ser antissocial, pouco afeita ao relacionamento político com deputados, senadores e partidos. “Vamos supor que a Dilma não tivesse a mesma disposição para conversar que eu tinha. Por razões dela, sei lá. O dado concreto é que, de uns tempos para cá, a Dilma tem colocado na agenda reuniões com empresários e partidos políticos”.

O fato de a presidente ser mulher também contribui para esse relacionamento difícil, afirmou Lula. “É a primeira vez que a gente tem uma mulher. O papel dela não é tão fácil quanto o meu porque 99% das pessoas que recebia eram homens, e homem fala coisa que mulher não pode falar, conta piada. Não há hábito do homem ainda perceber a mulher num cargo mais importante. Mas os homens vão ter que se acostumar. Uma mulher não pode se soltar numa reunião onde só tenha homem. Então acho que as pessoas têm que aprender a gostar das outras pessoas como elas são. A Dilma é assim e é assim que ela é boa para o Brasil. A mesma coisa é a Graça [Foster]. É uma mulher muito respeitada também. Não brinca nem é alegre, mas cada um tem seu jeito de ser”.

 

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