Dilma sofreu derrota, mas gravidade do cenário é relativa
Fernando Rodrigues
Comissão tem poderes limitados para investigar Petrobras
Emendas ao Orçamento tendem a desidratar rebelados
O governo sofreu um grande revés na Câmara dos Deputados nesta terça-feira (11.mar.2014). Foi criada uma comissão externa de deputados para averiguar suspeitas de corrupção na Petrobrás.
O PSDB, maior partido de oposição, classificou o fato como ''derrota histórica''. O governo reagiu e manda hoje (12.mar.2014) à Câmara ministros para explicar como está a investigação sobre suspeitas de que funcionários da Petrobras teriam recebido propina para beneficiar uma empresa da Holanda.
É evidente que o governo demorou a reagir. Errou feio e perdeu no plenário da Câmara. Os ministros poderiam ter ido mais rapidamente ao Congresso explicar o que se passa. Agora, não dá mais para reverter os votos de 267 deputados que trucidaram a posição do Planalto e foram a favor da comissão externa para acompanhar como anda a suspeita de que a holandesa SBM Offshore, que tem negócios com a Petrobras, teria pago suborno aqui no Brasil.
Na política, entretanto, é recomendável analisar todos os aspectos de um determinado cenário antes de fazer previsões definitivas. Na noite de terça-feira, a quente, muitos políticos achavam que era o fim da linha para o governo Dilma Rousseff no Congresso. Que a partir de agora será só ladeira abaixo.
Mas eis aqui alguns pontos que também devem ser considerados com um pouco de frieza:
1) Efeitos diretos para Dilma e alto escalão do governo: se houvesse chance de alguém com grande proximidade ao governo estar envolvido nesses supostos trambiques da Petrobras, certamente o Palácio do Planalto teria se esforçado um pouco mais para impedir a votação da terça-feira. Essa é apenas uma premissa, é claro. Tem sido raro um governo –do PT ou do PSDB– deixar as coisas correrem mais ou menos soltas sabendo que corre um risco muito grande numa determinada situação/investigação;
2) Revoltosos têm vantagem relativa: foram 267 votos a favor da criação da tal comissão. Ou seja, 10 a mais do que a metade da Câmara. É um bom número para quem deseja destruir o governo. Mas eis aqui outra premissa: se o Palácio do Planalto liberar o pagamento de emendas ao Orçamento para, digamos, 50 ou 60, desses deputados emburrados, o que acontecerá? Os 267 votos serão rapidamente desidratados para a redondeza de 200. A revolta corre o risco de minguar;
3) Poder limitado da comissão: alguém já ouviu falar de uma comissão externa da Câmara que tenha abalado o trabalho de algum governo nos últimos 30 anos? Pois é. É claro que sempre tem uma primeira vez. Mas deve-se considerar que essa comissão não tem poder de uma CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito). Não pode quebrar de sigilos. Não pode convocar de testemunhas. Enfim, pode produzir muito calor e pouca luz;
4) Petrobras será abalada: esse é talvez o possível impacto mais negativo. A maior estatal brasileira tem ações negociadas em Bolsa. Seu valor de mercado já anda depauperado e pode ficar em situação ainda pior, pois ficará sempre suspeita até que termine a tal investigação sobre os supostos pagamentos de propinas.
Tudo considerado, Dilma Rousseff sofreu um revés de razoável tamanho na terça-feira com a criação da comissão para acompanhar investigações sobre a Petrobras. Mas não foi propriamente o fim do mundo nem há certeza de que essa comissão produza um impacto decisivo na eleição de outubro. Pode até provocar. No momento, entretanto, isso parece incerto. É preciso esperar um pouco para conhecer qual será a exata reação do governo e como será a composição da comissão e o seu modo de atuar.
E há ainda outro componente eleitoral a ser levado em conta. Para o público externo continua a vigorar a imagem propagada pela presidente da República. Qual seja a de que Dilma Rousseff está “enfrentando esses fisiológicos do Congresso e por isso está esbarra em dificuldades”. As pesquisas mostram que esse é o senso comum disseminado entre muitos eleitores.