Inflação não se combate com tiro de canhão, diz Guido Mantega
Fernando Rodrigues
O ministro da Fazenda, Guido Mantega, afirma que o governo da presidente Dilma Rousseff seguirá sua ''política gradualista'' de combate à inflação e explicou por que considera este o melhor caminho, sem opção por uma ''política heroica'' ou um ''tratamento de choque''.
Em tom crítico e de condenação, durante entrevista ao programa Poder e Política, do UOL e da ''Folha'', Mantega disse que seria fácil reduzir a inflação rapidamente no Brasil: ''É só colocar uma bala de canhão: chuta o juro para cima, a economia vai definhar, você vai ter recessão. Aí sim você vai ter uma inflação baixa. Mas aí é a paz do cemitério''.
Em sua opinião, quem promete inflação menor do que a meta atual de 4,5% ''pode ter más intenções''. Que tipo de más intenções?
''Subir muito a taxa de juros. Como combatiam a inflação no passado? Era assim: valoriza o câmbio e sobe violentamente a taxa de juros (…). Já tivemos aqui no Brasil taxas de juros reais de 30% a 40%. Armínio Fraga [ex-presidente do Banco Central e conselheiro econômico de políticos do PSDB] praticou essas taxas. Tenho receio de que essa seja a política: dar um chute na taxa de juros. A taxa de juros vai diminuir a inflação causando uma recessão na economia, destruindo a economia''.
Segundo Mantega, esse tipo de política econômica ''faria muito mal à economia e nós não faremos isso'', acrescentando que ''jamais jogaremos nas costas da população o ajuste da crise mundial''.
Dentro de sua política gradualista, o ministro diz que será possível levar a inflação para o centro da meta, de 4,5%, em 2018. Será o último ano do mandato do próximo presidente. Ele especula um pouco sobre a taxa recuar para um nível mais baixo, mas dá a entender que essa seria uma situação excepcional. Ou seja, se Dilma Rousseff for reeleita, os brasileiros terão de conviver com um aumento de preços anual sempre acima de 4,5% durante todo o segundo mandato da petista.
Mantega promete uma novidade, já defendida por economistas de oposição: num eventual segundo mandato petista no Planalto, o ministro acha possível estreitar a banda de flutuação da meta de inflação. Hoje, a faixa de tolerância é de dois pontos percentuais, para mais ou para menos. Como o centro da meta que é de 4,5%, são aceitas taxas anuais que vão de 2,5% (o piso) a 6,5% (o teto).
O ministro da Fazenda sugere que uma nova administração dilmista reduzirá a banda atual de dois pontos para um ponto ou um ponto e meio percentual. Dessa forma, a inflação anual poderia ficar, no limite mais estreito, confinada numa faixa de 3,5% a 5,5%.
Mantega rebate as críticas de que a inflação esteja sendo contida artificialmente pelo represamento de preços. Afirma que, em sua avaliação, um tarifaço é ''desnecessário''.
Em sua defesa, diz que o governo aumentou o preço de remédios, planos de saúde e energia. Indagado, então, sobre se os adversários do governo mentem ao dizer que é necessário um tarifaço no início de 2015, ele responde: ''Não sei se mentem, mas podem ter más intenções''.
Lembrado que a própria estatal Petrobras reclama do represamento de preços da gasolina, o ministro, primeiro, diz que o governo tem aplicado, nos últimos anos, duas vezes ao ano para o combustível.
Em seguida, sinaliza que haverá um reajuste neste ano eleitoral. ''Os preços vão subir'', afirmou, mas declara que o aumento ''não pode ser exagerado, porque senão causará prejuízos a todo mundo''.
E insiste na receita de que, para estatal recuperar seu faturamento, o melhor caminho é ''pelo aumento da produção''.
Durante a entrevista, o ministro demonstrou insatisfação com duas críticas recentes. Uma, do atual presidente da Fiesp (Federação das Indústrias de São Paulo), Benjamin Steinbruch, que afirmou que só ''louco'' investe no Brasil atualmente.
''Ele está redondamente equivocado'', disse Mantega, citando números de investimentos estrangeiros no país.
A outra crítica foi do ex-presidente do Banco Central Armínio Fraga (governo FHC), de que o governo Dilma está segurando artificialmente o preço do câmbio, numa espécie de populismo cambial.
''Ele está redondamente enganado'', retrucou, alfinetando o hoje principal economista aliado ao candidato a presidente pelo PSDB, Aécio Neves, ao dizer que ''artificialismo'' ocorreu no governo FHC. ''Não seguramos inflação no câmbio; quem fez isso foram governos anteriores''.
Sobre as previsões de que o país pode ter registrado uma recessão técnica no primeiro semestre deste ano, Mantega prefere dizer que deve ter ocorrido um ''crescimento pequeno, uma estabilidade''.
Reconhece, porém, que ''não foi um bom resultado'' e joga parte da responsabilidade sobre a Copa do Mundo. ''[A Copa] foi um sucesso do ponto de vista de organização. Do ponto de vista da produção e do comércio, prejudicou.''
Em relação às previsões de que o governo não conseguirá cumprir a meta de economizar 1,9% do PIB (Produto Interno Bruto), o que já é admitido reservadamente por parte de sua equipe, o ministro concede que este ''é um ano mais difícil'', mas insiste que continuará perseguindo o cumprimento da promessa.
Ao ser questionado sobre o motivo de a presidente Dilma não ter, até agora, sinalizado mudanças na política econômica num eventual próximo mandato, como chegou a ser sugerido pelo ex-presidente Lula, o ministro afirmou:
''Temos muitas coisas a consertar no Brasil. Só que você tem que olhar o saldo. Consertamos uma série de coisas, mas muitas coisas têm que ser consertadas'', afirmou, sem citar quais.