Blog do Fernando Rodrigues

Análise: Dilma e o esgarçamento da capacidade de governar

Fernando Rodrigues

Cresce sensação de que petista não tem poder de reação

Atos de 13 de março serão termômetro da crise política

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A presidente Dilma Rousseff enfrenta um de seus piores momentos

Delcídio do Amaral acusou Lula e Dilma Rousseff de terem cometido crimes. Lula foi conduzido coercitivamente à Polícia Federal para depor. A Lava Jato avança sobre o Palácio do Planalto.

Nesse cenário, há duas perguntas principais ouvidas em Brasília: 1) Dilma Rousseff terá poder de reação para sair da crise política, aprovar medidas para recuperar a economia e ficar na cadeira até 2018? 2) A oposição tem músculos suficientes para organizar um processo de impeachment para forçar uma troca de governo nas próximas semanas ou meses?

Para tentar responder a essas perguntas é necessário revisitar o processo que produziu a atual conjuntura política no Brasil.

Logo depois da segunda posse de Dilma Rousseff no Palácio do Planalto, em 1º de janeiro de 2015, passou a existir na sociedade um sentimento difuso sobre a capacidade gerencial da petista. Algo como “ela é honesta, mas não sabe governar”.

Essa sensação ficou em estado de hibernação no ano passado. Não se disseminou de maneira generalizada na sociedade. Era como se parte dos brasileiros dissesse: “Vamos esperar um pouco para ver como ela vai lidar com a crise econômica. Vamos ver como evoluem as investigações de corrupção”.

Essa benevolência contida dos brasileiros ficou clara na adesão modesta aos atos de protesto durante 2015. Nunca houve manifestações nas quais se enxergava todo o país representado –embora o volume de pessoas tenha sido expressivo em algumas oportunidades.

Os eventos das últimas semanas podem (e parecem) marcar o final dessa relação condescendente.

Passado o hiato que foi do Natal de 2015 até o Carnaval de 2016, o aumento do mau humor geral passou a ser mais visível dentro do Congresso e em círculos frequentados por agentes econômicos e financeiros, em São Paulo e no Rio de Janeiro.

Até o final de 2015, ouvia-se de muitos críticos de Dilma Rousseff afirmações sobre a inconveniência de uma interrupção do mandato presidencial.

O clima até o início deste ano era assim: “É ruim para o Brasil que a presidente saia apenas por ser incompetente. Ela pode não ser a pessoa adequada para estar no comando, mas seria muito traumático retirá-la só por essa razão. Estaríamos banalizando o instrumento do impeachment. O melhor é que ela consiga contornar a crise e o país volte a se estabilizar. Em 2018 muda-se o governo”.

Agora, as avaliações se tornaram bem diferentes e menos compreensivas. Mesmo quem antes era ponderado e contra o impeachment agora fala de maneira direta sobre a incapacidade de Dilma para reagir. “Não há rumo nem perspectiva”, sintetizou ao UOL a veterana deputada federal Luiza Erundina (PSB-SP), de 81 anos.

É raríssimo nos meios políticos, empresariais e financeiros alguém que acredite na capacidade de a presidente Dilma Rousseff fazer o país voltar a ter um ambiente propício à recuperação. A síntese é assim: “Com o atual governo, o Brasil ficará parado ou vai andar para trás até 2018”.

Contribui para o pessimismo geral o forte “efeito demonstração” da Argentina.

O país vizinho está com a economia depauperada. O parque industrial é sucateado. Parte da dívida externa argentina continua em moratória. Mas bastou Mauricio Macri ser eleito, em novembro de 2015, para que a credibilidade do país melhorasse de maneira exponencial. A ex-presidente Cristina Kirchner estava desgastada. Não conseguia mais reagir.

A sensação agora –em alguns círculos antes pacientes com o Planalto– é a de que tudo o que Dilma Rousseff fizer não dará certo.

A petista apresentou duas propostas principais neste ano de 2015: recriar a CPMF e aprovar uma reforma da Previdência. São diminutas ou nulas as chances de sucesso nos 2 casos.

O pior para a presidente é que ela está manietada pelo raquitismo do apoio que tem no Congresso, pela crise econômica e pelas últimas revelações da Lava Jato.

A delação premiada do senador Delcídio do Amaral (PT-MS) e a condução coercitiva de Lula para depor são fatos que emparedam Dilma Rousseff.

Não há no horizonte próximo nada que indique uma reação da presidente. Ao contrário. A economia está em recessão profunda, a pior em 25 anos. O desemprego aumenta a cada mês. A inflação segue pressionada.

Apesar do alto grau de imprevisibilidade da atual crise (nunca se sabe onde a PF dará uma batida amanhã ou depois), a próxima data a ser observada é o fim de semana de 12 e 13 de março de 2016.

No dia 12, o PMDB realiza sua convenção nacional, em Brasília. Um grupo pretende aprovar uma moção pelo rompimento do partido com o governo de Dilma Rousseff. A hipótese de isso prosperar era relativamente pequena até há 1 mês. Agora, não se sabe.

No dia seguinte, 13 de março, um domingo, estão convocados atos em dezenas de cidades brasileiras. O PSDB e outros partidos de oposição vão apoiar esses protestos contra Dilma Rousseff. Nunca os partidos de oposição estiveram tão engajados na convocação dessas manifestações.

É impossível prever o grau de aderência da sociedade aos protestos. Há indícios de que agora o clima é mais favorável à oposição do que foi em 2014. Se isso se confirmar, com grandes atos pelas ruas, o processo de impeachment ganhará musculatura no Congresso.

O oposto também é verdadeiro. Se poucas pessoas forem às ruas, o Planalto ganha algum oxigênio.

O mais provável sobre 13 de março (e também mais dramático) são os indícios de que haverá confrontos físicos entre militantes pró e contra o governo. Esse cenário polarizado é ruim para a democracia e seu desfecho é imprevisível.

O combustível real para a oposição está na iminência da instalação do processo de impeachment contra Dilma na Câmara dos Deputados.

Na 3ª feira (8.mar.2016), o Supremo Tribunal Federal deve liberar o acórdão do julgamento que tratou do trâmite do impeachment no Congresso. Pelas contas que podem ser feitas agora, é possível que o impedimento de Dilma seja analisado pelo plenário da Câmara no final de maio ou início de junho de 2016.

OUTRO PLANETA
Contribui um pouco com esse quadro de esgarçamento da capacidade de Dilma para governar uma característica da presidente da República.

A petista é portadora de uma incapacidade dupla no cotidiano do poder.

Primeiro, acha que sua probidade no plano pessoal pode (e sempre vai) contaminar positivamente a sua probidade na política –o sofisma “se eu sou honesta, meu governo é honesto”. A segunda deficiência dilmista é nunca ter conseguido superar a inabilidade para articular no mundo da micropolítica diária de Brasília.

Ninguém na capital da República, seja no governo ou na oposição, tem dúvidas sobre a honestidade pessoal da presidente da República. Ocorre que ao seu lado está um sistema degradado por anos e anos (inclusive aperfeiçoado em governo anteriores, não petistas).

Em momentos de crise política, tudo vira a mesma coisa. Não adianta o político dizer que não é ladrão. É necessário que o conjunto da obra seja coerente. O discurso da presidente é mais ou menos assim: “Eu sou honesta. Não sabia que meu marqueteiro recebeu dinheiro da Odebrecht no exterior. Não sabia que a compra da refinaria de Pasadena era um péssimo negócio. Não sabia que vários diretores da Petrobras estavam recebendo propinas de empreiteiras”.

Pouco importa se Dilma fala a verdade ou não ao falar “eu não sabia”. O problema inextricável é que a beneficiária final de todos esses eventuais desvios –se de fato ocorreram– foi Dilma Rousseff.

A presidente também tem um comportamento principista no pântano da política. Detesta algumas personalidades. Tem o PMDB como principal aliado, mas rejeitou desde sempre um dos caciques dessa legenda, Eduardo Cunha.

Quem tem participado de reuniões políticas com a presidente em semanas recentes sai da sala achando que a petista vive num mundo à parte.

Essa atitude pode ser só uma forma de Dilma tentar passar otimismo aos interlocutores. Aparentar tranquilidade para não tornar as coisas piores do que de fato são é um requisito que está no “job description” de qualquer governante. Mas tudo tem limite.

Muitos deputados, senadores, empresários e banqueiros acham apenas que a presidente realmente não entendeu até agora quais foram todos os seus erros nem o que precisa (ou pode) fazer para reverter a situação. Essa incapacidade cognitiva esgarça ainda a relação entre a petista e o mundo real.

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