Agências de publicidade questionam licitação de R$ 550 milhões da Petrobras
Fernando Rodrigues
Associações reclamam de prazo curto para propostas
Modelo de remuneração dos serviços indiretos é criticado
Edital exige “programa de integridade” e firmeza ética
A maior licitação da história da propaganda estatal no Brasil, de R$ 550 milhões (eis o edital), está sendo questionada pelas agências de publicidade. As corporações que representam o setor (Abap e Fenapro), contestam em carta o modelo remuneratório e o prazo para a entrega das propostas. O Poder360 teve aceso ao documento (leia a íntegra).
Este texto é de Fernando Rodrigues e Mateus Netzel e está no Poder360. Receba a newsletter.
Na carta, enviada ao presidente da Comissão de Licitação da Petrobras, Neimar Filipon, os representantes do setor pedem o adiamento do prazo de entrega das propostas para a licitação.
O edital da Petrobras foi divulgado em 6 de dezembro. A data de entrega das propostas é 5 de janeiro de 2017. Há vários feriados nesse período. As agências reclamam que apenas as 5 ou 6 gigantes do setor terão condições de se preparar para concorrer de maneira competitiva nessa licitação. Ou seja: seria uma concorrência dirigida para que só multinacionais tenham chance.
A licitação selecionará duas agências para prestar serviços de valor total estimado em R$ 550 milhões –mais que o dobro do orçamento de publicidade da estatal em 2015. A duração é de 910 dias (cerca de 2 anos e meio), com possibilidade de renovação pelo mesmo período, por meio de um termo aditivo.
Os serviços serão prestados em todo o território nacional e em mercados internacionais de atuação da Petrobras. As agências contratadas deverão centralizar o comando das operações no Rio de Janeiro, cidade onde fica a sede da estatal.
MODELO DE REMUNERAÇÃO
Além do prazo que consideram exíguo para apresentar as propostas, a Abap e a Fenapro questionam também a forma de remuneração dos serviços a serem prestados. As agências pedem que a Petrobras considere uma forma de remuneração/ressarcimento de algumas despesas indiretas. Por exemplo, o custo com realização de pesquisas; criação, produção e veiculação de peças/campanhas nos meios online; elaboração de marcas e logotipos.
O sistema publicitário no Brasil tradicionalmente remunera as agências apenas com base nos bônus que os meios de comunicação pagam quando veiculam anúncios –o chamado desconto de agência. Por exemplo, se um determinado anúncio custa R$ 10 milhões, a agência que negociou o plano de mídia para veiculação vai receber de volta da emissora de 9% a 15%, em média, como remuneração.
Esse sistema funcionou de maneira suave durante décadas, quando a TV aberta era a principal plataforma para publicidade no país. Nos últimos anos, entretanto, a divisão do bolo publicitário privilegia menos as redes de TV, que praticam o pagamento via o chamado bônus de volume (BV). A título de exemplo, em 2015, as 5 maiores TVs abertas tiveram uma redução de R$ 427 milhões (38%) na publicidade do governo federal em relação a 2014. Leia uma reportagem sobre os cortes do governo federal em publicidade em 2015.
Com o crescimento das plataformas digitais, sobretudo os grandes da área como Google e Facebook, as remunerações das agências foi se degradando. É por essa razão que agora o setor está pedindo para que serviços específicos relacionados a uma conta publicitária sejam remunerados individualmente pela empresa que contratou o serviço, no caso, a Petrobras.
Além disso, as agências ainda reclamam que a Petrobras receberia cerca de 25% desses “honorários” pagos pelos veículos de comunicação. Um efeito disso, segundo as empresas, seria de que no caso de campanhas realizadas no exterior, onde a prática do desconto de agência não é comum, as agências estariam prestando serviços de maneira gratuita à estatal.
Nas palavras de Abap e Fenapro, “o contrato impõe condições leoninas e que até poderão ser aceitas por participantes, aderindo por desespero e necessidade de gerar receitas, apesar de que tenham alto potencial de serem negativas, seja para as agências a serem contratadas, seja para a Petrobras, que poderá verificar, em pouco tempo, a inexequibilidade do contrato”.
PROGRAMA DE INTEGRIDADE
A pressão das agências será 1 teste para o presidente da Petrobras, Pedro Parente. O 1º edital de publicidade da sua gestão é talvez o mais rígido até hoje nessa área na administração pública.
Entre outras exigências, as empresas que vencerem a licitação serão obrigadas a apresentar um “programa de integridade” baseado em portarias e diretrizes definidas pela Controladoria Geral da União em 2015.
RESPOSTA DA PETROBRAS
Na 5ª (15.dez), a assessoria da estatal enviou um posicionamento ao Blog. Eis o comunicado na íntegra:
“Em relação à nota “Agências de publicidade questionam licitação de R$ 550 milhões da Petrobras”, publicada nesta quarta-feira (14/12) no Blog do Fernando Rodrigues, a Petrobras esclarece:
– Está incorreta a informação de que o valor da nova licitação para contratação de agências de propaganda é o dobro do orçamento (valor estimado) de 2015. O valor total estimado de R$ 550 milhões corresponde ao período contratual de dois anos e meio. Portanto, o orçamento é de R$ 220 milhões por ano, valor 35,7% menor que o orçamento de 2015 (valor estimado dos contratos) que era R$ 342 milhões.
– O prazo de 30 dias previsto no edital para a entrega das propostas segue o que está determinado pelo decreto 2745/98, que disciplina os procedimentos licitatórios a serem realizados pela Petrobras e determina, no item 5.4, que: “A concorrência será convocada por aviso publicado, pelo menos uma vez, no Diário Oficial da União e em jornal de circulação nacional, com antecedência mínima de trinta dias da data designada para apresentação de propostas.”
– Sobre a afirmação de que “há diversos feriados nesse período”, cabe observar que os dois únicos feriados existentes neste intervalo de tempo – as datas correspondentes ao Natal e ao Ano Novo – ocorrerão em finais de semana.
– Vale salientar que se trata de uma concorrência pública e aberta, que dá amplo acesso a qualquer agência de publicidade que reúna as condições exigidas no edital.
– Não faz parte do escopo da contratação a realização de pesquisas de mercado e de elaboração de marcas e logotipo. Portanto, não procede o pedido de consideração de uma remuneração adicional para tais serviços.
– A criação, a produção e a veiculação de peças e campanhas nos meios online seguem exatamente o mesmo padrão de remuneração praticado para os outros meios.
– A Petrobras cumpre o estabelecido pelo Conselho Executivo das Normas-Padrão (CENP), que define a remuneração padrão de agência de propaganda em 20% do valor bruto negociado de compra de espaço de mídia. O CENP estabelece ainda que, no caso de empresas que investem acima de 25 milhões de reais, pode ser aplicado um percentual negociável do desconto padrão de até 5%, passando a agência a ser remunerada em 15%.
– Não é verdade que as agências estariam prestando serviços gratuitos no caso de campanhas no exterior. Visto que, na norma-padrão do CENP, não há regulamentação para remuneração de agência em veiculações internacionais, a remuneração das agências contratadas se dará em modelo similar ao Desconto-Padrão de Agência praticado no Brasil. Cabe ressaltar que, no período de 2014 a 2016, o investimento em veiculações no exterior correspondeu a 0,15% do valor total investido em mídia pela Petrobras”.