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Arquivo : guerra às drogas

Ex-presidente da Colômbia critica criminalização de drogas no Brasil
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Fernando Rodrigues

Sul-americanos defenderão descriminalização na ONU

Ex-presidente colombiano vê “revisão importante” nos EUA

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O ex-presidente colombiano Ernesto Samper e Dilma Rousseff no Planalto, em 13.out.2015

Ex-presidente da Colômbia (1994-1998) e atual secretário-geral da Unasul (União de Nações Sul-Americanas), o economista Ernesto Samper criticou a persistência da criminalização das drogas para consumo pessoal no Brasil.

Em abril de 2016, Brasil e outros 11 países da sul-americanos, que integram a Unasul, defenderão na ONU a revisão da atual política de combate ao narcotráfico. O encontro ocorrerá em Nova York. Neste ano, em 31.ago.2015, a Unasul aprovou um documento em que pede a “revisão” da atual política de combate ao tráfico.

A entrevista de Samper ao UOL foi realizada ontem (14.out.2015) pelo repórter André Shalders. Participou da edição o repórter Mateus Netzel.

Samper chegou a Brasília na 3ª e fica até hoje (15.out.2015). Reuniu-se com a presidente Dilma Rousseff e participou de um evento na Universidade de Brasília (UnB) sobre a política de drogas na América Latina. Ele dividiu a mesa de encerramento do evento com o secretário Nacional de Políticas sobre Drogas do Ministério da Justiça, Luiz Guilherme Paiva –que assumiu o cargo neste mês de outubro.

O ex-presidente colombiano diz que a América Latina e os EUA vivem um movimento de avanços na política de drogas. O Brasil, por sua vez, ainda criminaliza o consumo dessas substâncias.

“Há em todos os países da América do Sul já uma aceitação sobre o tema da dose mínima. Com exceção do Brasil, em que o tema está pendente no Supremo Tribunal Federal, a posse de uma dose mínima é permitida”, disse.

Como ex-presidente da Colômbia, Samper diz que seu país gasta até hoje cerca de 2% do PIB com a violência decorrente do tráfico. Durante seu mandato, ele enfrentou um dos piores momentos da política de “guerra às drogas”.

Em entrevista ao Blog, Samper conta que a reunião que teve com Dilma tratou inclusive de temas como a ferrovia transoceânica (ligando o Brasil ao pacífico). E reiterou o posicionamento contra o impeachment da presidente brasileira. “Convido as forças políticas brasileiras para que busquem um acordo de governabilidade”, disse.

A seguir, trechos da entrevista:

UOL – Existe uma tendência na América Latina para uma revisão da política de drogas?
Ernesto Samper – Há em todos os países da América do Sul já uma aceitação sobre o tema da dose mínima (definição, em lei, da quantidade de droga cujo porte não é punido com prisão). Com exceção do Brasil, em que o tema está pendente no Supremo Tribunal Federal, a posse de uma dose mínima é permitida. O que ninguém entende é que se permita o consumo de uma dose mínima, mas se criminalize o porte. Isso representa uma inconsistência, mas de todo modo, acredito que há avanços que aparecem registrados nas posições da Unasul e no documento, que é consensual entre os países da Unasul.

Se olhamos somente dentro do Ocidente, há avanços significativos. Há, por exemplo, uma concordância com a teoria de reparação do dano, defendida pela Europa e pela América do Sul. A Europa compartilha a ideia da América do Sul de que deve haver uma substituição social dos cultivos ilícitos, e não apenas sua destruição.

Qual o saldo para a Colômbia da chamada “guerra às drogas”, desde que o senhor deixou a presidência em 1998?
A Colômbia é talvez o país que mais sofreu com a luta contra as drogas no continente. Ainda hoje, nós (os colombianos) pagamos 2% do PIB (produto interno bruto) como custo da violência em geral, boa parte devido ao narcotráfico e ao financiamento das diferentes formas de violência que existem na Colômbia: violência das guerrilhas, violência paramilitar, violência de  sicários (assassinos de aluguel).

Mas eu noto, na região, uma mudança qualitativa. Já não estamos no pesadelo dos anos 1990, quando a luta contra as drogas era um assunto de segurança nacional nos EUA. Eles transferiram para América do Sul a guerra que não podiam ganhar dentro de suas próprias fronteiras. Na época em que  houve o que podemos chamar de “vietnamização da luta contra as drogas”, eles buscaram um território distinto para ganhar uma guerra que estavam perdendo nos Estados Unidos.

Creio que nos EUA estão vivendo uma revisão importante do tema das drogas e na América do Sul, como comprova este fórum (em Nova Iorque) em que falaremos de uma nova posição da América do Sul frente ao tema das drogas, em plena Assembleia Geral da ONU. Sem dúvida, há um avanço muito significativo.

A Unasul defende a descriminalização só da maconha ou de todas as drogas?
É claro que não se pode dar o mesmo tratamento para a maconha, a cocaína, a heroína, as drogas sintéticas. E não se pode dar (o mesmo tratamento), porque o grau de nocividade de cada uma delas é distinto. O documento (aprovado pela Unasul) defende que a política de drogas volte a ter em conta as condições e o grau de nocividade de cada uma delas, para que o tratamento não seja o mesmo para todas. Para que haja um tratamento seletivo de acordo com as que não sejam viciantes, que produzam danos neurológicos ou não, cada uma delas tem variações. É claro, a droga que tiver mais condições, digamos, de favorecer a saúde, em termo de afetar menos, é a maconha.

A descriminalização não é (o mesmo que) chegar até a legalização, que permite qualquer consumo e que se consuma o que quiser. Mantém-se políticas estatais para regular e controlar o consumo das drogas.

Ontem (3ª) o sr. se encontrou com a presidente Dilma. Como foi?
A reunião foi muito cordial. Foi sobre a agenda da Unasul aqui no Brasil, que é uma agenda muito ampla, que vai de bancos de medicamentos a obras de infraestrutura, como a ferrovia interoceânica. Minha opinião é de que a presidente Dilma pode e deve terminar seu mandato. E que qualquer interrupção desse mandato por razões não aceitáveis do ponto de vista constitucional e legal seria um salto ao vazio, que ocasionaria uma maior desestabilização da situação política do Brasil.

Essa é nossa posição, e convido as forças políticas brasileiras para que busquem um acordo de governabilidade. Seria a melhor saída para a democracia brasileira ao redor de três pontos fundamentais: o primeiro, evitar que os 22 milhões de brasileiros que saíram da condição de pobreza nos últimos 10 anos não voltem a ela por conta da crise econômica; o segundo, encontrar medidas de reativação econômica que não impliquem sacrifícios sociais e terceiro, preservar a institucionalidade democrática brasileira.

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