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Governo protelou ao máximo para fornecer dados e cumprir sentença
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Fernando Rodrigues

Formato das informações é confuso e visa a dificultar compreensão

Secom se recusou a fazer compilação inteligível por “falta de pessoal disponível”

O governo federal lutou o quanto foi possível para não fornecer os dados requeridos sobre seus gastos publicitários. Várias manobras foram tentadas até que veio a sentença definitiva do Superior Tribunal de Justiça neste ano –cujo cumprimento se deu no final de novembro de 2014.

Ainda assim, os dados fornecidos foram deliberadamente apresentados de maneira a dificultar a sua compreensão. A Secom (Secretaria de Comunicação Social) da Presidência da República se recusou a compilar as informações agrupando os valores para veículos de um mesmo grupo empresarial. A alegação para não fazer o levantamento foi falta de pessoal.

O Blog apurou, entretanto, que a razão real foi a pressão de empresas estatais que não desejavam ter suas contas publicitárias apresentadas de maneira transparente.

Por essa razão, continua difícil saber exatamente quanto foi o valor total recebido por redes de TV ou de rádio e por suas coligadas, pois muitas vezes essas empresas têm CNPJs diferentes nas várias cidades e Estados em que estão presentes.

O que mais atrasou a divulgação das informações, entretanto, foi a insistência da Secom em dizer que não havia entendido corretamente a primeira decisão judicial, proferida há cerca de dois anos. Todos os argumentos do Palácio do Planalto foram rebatidos com sucesso pela advogada Taís Gasparian, que representou o jornal “Folha de S.Paulo” no processo.

O governo praticou duas chicanas jurídicas principais que foram derrotadas no STJ.

Primeiro, como o pedido inicial de informações era de 2011, a Secom queria fornecer dados apenas até esse ano. O espírito do requerimento, entretanto, era claro: solicitava-se dados até o momento mais recente.

Foi necessário derrotar vários recursos até que a Secom fosse forçada a oferecer os dados até 2013 –embora agora já existam informações de 2014 disponíveis, mas ainda não divulgadas.

O segundo ardil protagonizado pela Secom foi cumprir a decisão do STJ sem informar exatamente quanto cada órgão do governo gastou de publicidade com cada veículo de comunicação individualmente.

Os dados foram fornecidos apenas com o valor total que cada veículo havia recebido, mas sem a informação a respeito de quem dentro do governo (qual órgão ou entidade) havia feito os pagamentos. E mais importante: a Secom não queria fornecer esses dados relativos às empresas estatais que competiam no mercado (Banco do Brasil, Caixa, Petrobras e outras), sob a alegação de que isso poderia prejudicá-las perante suas concorrentes.

O STJ derrubou todas essas argumentações. O caso “tramitou em julgado” e foi firmada uma jurisprudência de grande relevância. A decisão do STJ poderá ser usada agora em todos os cerca de 5.600 municípios brasileiros e nos 26 Estados e no Distrito Federal quando alguém desejar obter dados detalhados sobre gastos estatais com publicidade.

Para ter acesso à sentença do STJ, basta entrar no site do Tribunal e clicar em Processo/Consulta processual. O número do mandado de segurança a ser pesquisado é 16.903, de 2011. O Blog tem à disposição a ementa do processo para download.

Vale registrar o que escreveu o ministro relator do caso, Humberto Martins, ao rejeitar os recursos da Secom. O magistrado recusa os “embargos de declaração” do governo dizendo claramente que o Palácio do Planalto estava obrigado a entregar todos valores “de gastos de publicidade e propaganda com entidades e órgãos da administração federal direta e indireta”.

O governo havia argumentado ser impossível detalhar “gastos das empresas públicas e sociedades de economia mista”, por causa do teor do parágrafo 1º do artigo 5º do Decreto n. 7.724/2012, o instrumento que regulamentou, no âmbito do Poder Executivo federal a Lei de Acesso a Informações Públicas. Escreveu o ministro Humberto Martins: “Não há o vício alegado”.

O magistrado disse que o “teor do art. 5o, § 1o do Decreto 7.724/2012, em conjunto com outros argumentos, foi apreciado na ocasião do julgamento de mérito da impetração, que fixou a obrigação de fazer que agora se executa. Assim, foi determinado que os gastos com publicidade e propaganda das empresas públicas e sociedades de economia mista deveriam ser fornecidos”.

O tal parágrafo 1º do artigo 5º do decreto 7.724/2012 diz o seguinte: “A divulgação de informações de empresas públicas, sociedade de economia mista e demais entidades controladas pela União que atuem em regime de concorrência, sujeitas ao disposto no art. 173 da Constituição, estará submetida às normas pertinentes da Comissão de Valores Mobiliários, a fim de assegurar sua competitividade, governança corporativa e, quando houver, os interesses de acionistas minoritários”.

Para o STJ, esse trecho do decreto 7.724/2012 “visualiza a possibilidade de fornecimento dos dados requeridos, ao invés de estar estipulada a alegada vedação”.

Trata-se de potente jurisprudência que pode ser colocada a serviço da transparência nas contas de vários governos sobre gastos publicitários.

O cumprimento dessa norma, entretanto, não é automática.

No caso da Secom, por exemplo, não há movimentação para colocar todos esses dados à disposição dos interessados em seu site na internet. O Palácio do Planalto também deixou de divulgar há alguns anos informações parciais sobre publicidade para todos os órgãos entidades públicas –embora o IAP forneça dados atualizados mensalmente para a Presidência da República.

As informações de 2014, que já existem em grande parte, só serão colocadas na página da Secom em meados de 2015. Até a publicação deste post, só estavam disponíveis os dados gerais de 2013, apontando para um gasto de R$ 2.313 bilhões com publicidade.

Para saber mais sobre o quanto é o gasto real anual do governo federal com publicidade e patrocínios, leia o post abaixo (“Em 2013, governo federal torrou R$ 5,139 bi em publicidade e patrocínios”).

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Em 2013, governo federal torrou R$ 5,139 bi em publicidade e patrocínio
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Fernando Rodrigues

Engana-se quem imagina que os gastos de R$ 2,313 bilhões com publicidade declarados em 2013 representem o valor total que o governo federal torrou para lustrar a sua imagem –essa cifra parcial está no site da Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República.

Eis o que mostra a Secom (clique na imagem para ampliar):

Publicidade-2013-total-administracao-direta-todos-os-orgaos-indirera-todas-as-empresasEsses R$ 2,313 bilhões não incluem despesas com “publicidade legal, produção e patrocínio”, como se pode observar nas letras miúdas da imagem reproduzida acima.

Não existe estimativa precisa sobre gastos com “publicidade legal” (publicação de balanços, por exemplo) e “produção” (os custos para fazer um filme de TV, entre outros). Publicitários consultados pelo Blog acreditam que o valor possa estar entre 10% e 30% do total consumido. Considerando-se um percentual médio de 20%, o montante de 2013 terá ficado em R$ 462,6 milhões.

Confrontado com esse valor (R$ 462,6 milhões), o governo sempre o questiona, dizendo haver exagero. Mas ao mesmo tempo chama a atenção o fato de a administração pública federal nunca se propor a dizer qual é a cifra exata. Essas despesas são opacas e nunca expostas ao público.

Há ainda os gastos com patrocínio. Times de futebol, equipes de Fórmula 1 ou bandas de música no interior consumiram R$ 2,363 bilhões de dinheiro federal em 2013 –segundo dados oficiais da Secom. Eis as informações (clique na imagem para ampliar):

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Em resumo, a administração pública federal gastou de publicidade, publicidade legal, produção de comerciais e patrocínio algo em torno de R$ 5,139 bilhões:

Publicidade: R$ 2,313 bilhões
Publicidade legal, produção de comerciais: R$ 462,6 milhões.
Patrocínios: R$ 2,363 bilhões
Total: R$ 5,139 bilhões

Na iniciativa privada, a empresa que mais gastou em publicidade no Brasil em 2013 foi a Unilever, com R$ 4,583 bilhões, segundo dados do Ibope Monitor.

Ocorre que os números coletados pelo Ibope são muito maiores do que a realidade. Trata-se de uma pesquisa que busca suas informações nas empresas de mídia do país, levando em conta o que foi publicado e o preço de tabela dos anúncios. No mercado publicitário, entretanto, um grande anunciante como a Unilever costuma negociar enormes descontos. O gasto total da empresa em 2013 com publicidade foi certamente bem inferior a R$ 4,583 bilhões –talvez não tenha chegado à metade dessa cifra.

Já no caso do governo, os números publicados são todos os que foram efetivamente pagos. São reais.

Tudo considerado, os R$ 5,139 bilhões gastos em 2013 fazem do governo federal, de longe, o maior anunciante do Brasil. E um dos maiores do planeta.

Com a decisão do STJ que permitiu revelar para onde vai todo esse dinheiro, fica agora mais transparente entender como a administração pública federal usa os recursos públicos para melhorar sua imagem –e também para influir no mercado brasileiro de mídia jornalística.

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Análise: distribuição de verbas equânime não resolve o problema
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Fernando Rodrigues

Governos em todos os níveis se escondem atrás de um falso argumento

Dizem procurar dar verbas publicitárias para todos conforme a audiência

A questão real é outra: não é necessário gastar tanto com propaganda

Há uma falsa disjuntiva no debate sobre gastos publicitários do governo federal e também de outros níveis pelo país.

Em geral, o governante (presidente, governadores ou prefeitos) diz que faz uma distribuição de verbas de propaganda oficial de maneira técnica, respeitando o tamanho, a abrangência e a relevância de cada veículo.

Esse argumento do uso da chamada “mídia técnica” foi desmontado com a divulgação sobre como estatais federais gastam suas verbas de publicidade.

Mas ainda que as verbas fossem realmente distribuídas de acordo com a abrangência de cada veículo, essa não seria a solução do problema da farra de verbas publicitárias que tomou conta de governos no Brasil –e é bom que fique registrado que o cenário da administração pública federal se repete por vários Estados e prefeituras de grandes cidades.

Para ser bem direto, o ponto principal está em responder à seguinte pergunta: por que o governo tem de fazer tanta propaganda?

A resposta é simples: não tem.

O governo não tem de fazer propaganda sobre cada aniversário do Plano Real (como Fernando Henrique Cardoso fazia) ou sobre as moradias entregues no programa Minha Casa, Minha Vida (como Luiz Inácio Lula da Silva fez e Dilma Rousseff ainda faz).

É bom que se diga que essas propagandas não são ilegais.

Não há limites legais no Brasil para gastos com publicidade estatal –aliás, não há tampouco bom senso.

O costume vem de longe. Acentuou-se durante a ditadura militar (1964-1985). Os generais presidentes usaram recursos públicos para alavancar algumas agências publicitárias amigas do regime, bem como para privilegiar os meios de comunicação de massa eleitos para vocalizar o que pensava o governo.

Essa também é uma prática recorrente em governos estaduais e em muitas prefeituras e câmaras municipais. Para piorar o quadro, quanto menor o Estado no Brasil, mais parece aumentar a compulsão por gastos com propaganda.

Trata-se de uma tendência também em muitos países pobres como o Brasil, como mostra este artigo de Mark Thompson e Marius Dragomir para a Fundação Open Society. Um estudo da OEA (Organização dos Estados Americanos) aponta a alocação de publicidade estatal como um “mecanismo de censura indireta”.

Quem já visitou países desenvolvidos sabe que propaganda estatal é, quase sempre, apenas para assuntos de real utilidade pública –uma catástrofe, uma campanha de vacinação.

Esse é o desafio no Brasil: limitar as propagandas estatais a temas de interesse público.

Mas há um complicador: como conter o ímpeto das empresas estatais que competem no mercado e se sentem livres para usar verbas publicitárias como bem entendem? Difícil encontrar uma resposta. Na dúvida, sucessivos presidentes da República deixam as coisas correrem soltas, exatamente como Dilma Rousseff tem feito.

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Em 2013, governo federal torrou R$ 5,139 bi em publicidade e patrocínio

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Globo teve R$ 5,9 bi de propaganda federal desde 2000
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Fernando Rodrigues

Ainda assim, emissora líder é a que mais perdeu no bolo de verbas do governo

TVs nesse período tiveram R$ 10, 7 bilhões para veicular propaganda  estatal

No último dia 14 de abril a Secom (Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República) atualizou o seu site com os dados gerais de gastos de publicidade estatal federal até o ano de 2012. Como de costume, os valores são apenas globais e por tipo de meio, omitindo quanto cada veículo ganha.

Mas num artigo de Roberto Bocorny Messias, secretário-executivo da Secom, pela primeira vez foram divulgados de maneira aberta, pelo próprio governo, os dados sobre cada uma das principais emissoras de TV do país. O texto foi publicado pelo site “Observatório da Imprensa” em 16 de abril de 2013.

O dado a ser destacado é a ainda fantástica prevalência das TVs abertas como meio preferencial para o governo fazer sua propaganda. E entre as TVs, a maior de todas é a Globo, apesar da queda em anos recentes.

Desde o ano 2000 (quando os dados passaram a ser compilados de maneira mais precisa), a TV Globo recebeu R$ 5,9 bilhões para veicular publicidade estatal federal –tanto da administração direta como indireta.

A imagem abaixo traz os dados sobre o que o governo federal gastou com TVs no ano passado e o acumulado desde o ano 2000:

Ao divulgar esses dados, a Secom afirma fazer “mídia técnica” e dar a publicidade de acordo com o tamanho de audiência de cada veículo. Nota-se que a preocupação principal foi usar o caso da TV Globo como exemplo. A fatia da emissora no bolo entre TVs caiu de 54,96% (em 2000) para 43,98% (em 2012) –muito por causa do avanço das TVs fechadas e da Record, como se pode observar no gráfico:

Embora com a Globo tenha acontecido uma acomodação compatível com o recuo da liderança dessa emissora na audiência das TVs abertas, não há como verificar se esse mesmo procedimento ocorre com todos os mais de 5.000 veículos cadastrados pelo governo federal para receberem verbas publicitárias.

As tabelas completas dos valores individuais investidos não são divulgadas. Não se conhece o montante exato enviado a cada um dos meios de comunicação por conta de propaganda estatal federal.

Ao divulgar os dados via “Observatório da Imprensa”, a Secom tampouco entra muito no mérito do uso de propaganda estatal de maneira tão disseminada. O silêncio é compreensível. Esse é um costume de todos os governos no Brasil, em todos os níveis, não importando o partido ao qual está filiado o chefe da administração.

O problema é que assim nunca é respondida a pergunta mais importante: por que um país como o Brasil precisou gastar R$ 1,797 bilhão em propaganda em 2012?

Há o argumento de que nesse bolo estão as empresas estatais que concorrem no mercado. Precisam anunciar para sobreviver. De fato, é uma ponderação a ser levada em conta. Mas levanta uma dúvida adicional: por que então os gastos dessas estatais não são divulgados em detalhes, para que se saiba em quais meios de comunicação estão investindo?

Aí a resposta do governo é conhecida. Trata-se de informação de caráter reservado. Os concorrentes privados das estatais poderiam tirar proveito se conhecessem os dados. Bom, essa é uma disputa que no futuro certamente será arbitrada na Justiça, pois está em conflito com a Lei de Acesso à Informação.

TVs abertas e outros meios
No caso da prevalência no Brasil das TV abertas na propaganda estatal federal, há mudanças no horizonte. Sem prejuízo desse meio de comunicação, é possível notar que tem ocorrido uma redistribuição na parte que sobra do bolo.

De 2000 a 2012, as TVs abertas continuaram soberanas. Aumentaram sua fatia nas verbas de propaganda estatal federal: tinham 54,4% e hoje pularam para 62,3%.

Os jornais impressos caíram de 21,1% para 8,2% desde o ano 2000 no bolo publicitário federal. Emissoras de rádio e revistas saíram da faixa dos 9% e recuaram para a dos 7%.

Já internet e mídia externa, que representavam quase nada no início da década passada, agora ficam, somadas, com mais de 12%. Eis o gráfico evolutivo:

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